sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Fator-Neme


Este é o nome dado às características comuns aos membros da família da minha mãe. O termo foi cunhado pela minha prima Karen, uma Neme legítima, filha da amada tia Sônia, caçulinha dos nove filhos (cinco mulheres e quatro homens) dos imigrantes libaneses Alfredo e Sálua, meus avós, além de escritora da biografia deles.

Os Nemes são detectados de longe. Primeiro de tudo, tendem a ter um humor gostoso que acalenta mesmo os momentos mais difíceis. Exemplo recente: uma querida tia teve uma leve amnésia após uma longa cirurgia. Com a ajuda de suas filhas palhaças, pregou peça no meu tio, o chamando pelo nome do primeiro namorado dela. Tio Neto quase foi internado também, coitado. Nemes são sensíveis e ciumentos.

Na gastronomia, Nemes são tarados por ovo frito e por arroz branco, puro mesmo. Também caem em tentação quando veem uma manteiga em temperatura ambiente, principalmente se tiver um pão fresquinho para acompanhar. Adoram café, e fazem belos bules com pó assentado. Quando passávamos juntos as ceias, fim dos anos 70, início dos anos 80, era uma coisa de louco. Acho que nunca vou apagar da minha memória aquelas mesas apetitosas. Imagine que cada família levava uns dois pratos e você pode ter uma idéia da fartura dos lombos, carneiros, ráchuas, charutos, tahines...

Amam música, livro, poesia, filmes e televisão. Talvez seja por isso que Nemes são notívagos. Cantam as canções que gostam, e cantam alto, sozinhos ou para quem amam. Isso vem desde quando minha mãe morava com os pais e todos os irmãos. Todos cantores, claro.

Livro também faz parte da casa de quase todo Neme. Diferentemente de muitos imigrantes libaneses (como a família do meu pai), meus avós maternos conseguiram formar os filhos, que também formaram seus descendentes, e assim por diante e adiante.

Também são poucos os Nemes que você pode conhecer na vida que recusariam um convite para o cinema. Adoram o fascínio da telona e da telinha. Meu avô, inclusive, foi o primeiro a ter uma tevê a cores em Bauru, “causando” geral por aqui.

Outra característica dos Nemes que tenho detectado ultimamente: cachorros. Quase todos tem ou tiveram belos cães. A terceira geração, minha e dos meus primos, é quase toda canina. Mas um, em especial, teve importância singular na nossa história. Era Lord, um meio pastor, meio collie, dos meus avós e um pouco de todo mundo. Fisicamente, parecia a Lassie, só que todo negro. Ficava no fundo da grande casa da Cussy Júnior, e, quando se soltava, corria para os pés do meu avô, já na cadeira de rodas. Certa vez, Lord fugiu e ficou desaparecido por quase uma semana. A família toda se preocupou. Em um dia de aula de inglês, quando minha mãe me levava (eu devia ter uns 10 anos), vimos o Lord a poucas quadras de casa. Lembro do orgulho de subir a rampa da casa da minha avó com ele, e a carinha dela de felicidade pela volta do companheiro
.
Nem dá para falar que o fator-Neme está determinado pela lógica simplista do DNA, já que a terceira turma da nossa família, felizmente, tem filhos próprios e adotados (talvez outra característica genuína). E todos bem Nemes. Um dos meus primos mais velhos é o caso mais incrível: há vários anos, ele gerou duas meninas e um menino. Quando as crianças cresceram, adotou um menino. Gostou. Adotou, aí, uma menina. Depois, mais uma garotinha, e o casal finalizou a saga recebendo um sétimo filho.

Aliás, se fosse para reunir todos da segunda, terceira, quarta e quinta geração dos meus avós (juro que eu acho que já tem tudo isso de gente na nossa árvore), teria de fechar um clube. E seria o BTC, onde três levas de Nemes pularam muito carnaval. Neme, aliás, sempre gostou de uma folia.

Tem um tio Neme que eu não conheci, o gêmeo.
Tem Neme que eu ainda não conheço, mas já gosto. Tem Neme briguento, apesar de que todos somos um pouco passionais. Tem até uma rua em Londrina com nome de Neme... e uma Neme gente boníssima. Tem Neme no Paraná, em Bauru, no resto do interior, na capital e até na Califórnia. Tem uns Nemes que já se reuniram na Europa (Dani é a rainha: eu, ela e tia Evelyn nos encontramos em Londres quando morei lá, e ela sempre viaja com a Ká para Paris). Tem Neme famoso - um dos melhores médicos que São Paulo já teve. E tem Neme chato também, mas todo mundo sabe quem eles são. Tem Neme moreno, loiro, magrelo, gordinho, alto, baixo. Tem vários Nemes de olhos claros - e eu adoro fazer parte dos descendentes que puxaram para meu avô. Tem Neme misturado com italiano, espanhol e até japonês. Tem muitos Nemes que choram fácil - eu, inclusive. Tem poucos Nemes carrancudos - geralmente, sorriem bastante. Tem os Nemes que se foram nos últimos anos - os dois tios e a tia deixaram uma saudade cortante, mas a certeza de que nós éramos amados por eles. Neme tem dessas: quer ser carinhoso até de longe.

2 comentários:

Fischer disse...

Tem vaga para um alemão nessa roda aí?

Karen disse...

Prima lindaaaaaaaaaa!!!!
Estou aqui com Mami e Dani lendo deliciosamente seu post.
Ficou PERFEITO!
Amei!
Beijos com aquelas saudades do tamanho do mundo!