segunda-feira, 9 de agosto de 2010

A VOLTA

E a vida volta sem eu nem perceber – ou querer. Sim, porque é possível você largar todo o caminho traçado porque perdeste seu pai e porque a dinâmica da família fica toda estremecida. Mas, não. O mundo continua te mandando pra frente, com seus prazos, planos, surpresas, emoções e um combustível que você nem sabe de onde saí. Sim, porque ainda ando perdida, com um sentimento de estar sem chão porque perdi meu pai há menos de um mês. E ainda respondendo às pessoas que me perguntam, sem saber: “e aí, como está o seu Said?”.

Mas a vida volta sem eu nem perceber – ou esperar. E foi quando ele ainda estava de cama, mas consciente, que recebi a convocação oficial do concurso que prestei para aí, sim, ficar efetiva na minha querida UEL. E eu pude contar para meu pai. Com a boca aberta para respirar, ele disse umas frases roucas, fez uma pergunta bem árabe (“quanto você vai ganhar, filhota?”), e depois falou parabéns e me deu recomendações (bem árabe). E eu, que costumo brindar até uma lua cheia especial com meus amigos, ainda não consegui comemorar de coração minha efetivação no lugar que eu mais queria, nesta grande universidade, com pessoas especiais e espaço para se desenvolver.

Mas a vida volta sem eu nem perceber – ou justamente porque a gente precisa dela. Paola voltou neste final de semana, de uma viagem por Londres, Áustria, Holanda, e encontramos a turma toda, que dividiu comigo – de longe e bem de perto - aqueles momentos terríveis do dia 17. Em Londrina, tenho reuniões, orientações, prestações... Felizmente, a exigência do calendário e a certeza de ter grandes amigos nos tira do furacão puramente apocalíptico-emocional de perder alguém assim, tão próximo.

Mas a vida volta sem eu nem perceber – ou porque a dimensão da morte me trouxe uma triste tranqüilidade: praticamente nada é imutável, inquestionável ou inevitável. Nada. Apenas a falta de vida é que nos amarra as mãos. É ali, no momento do caixão e na ausência física do meu pai que percebi a única coisa que nos paralisa e nos deixa impotentes. É só ali que não há o que se fazer – mesmo com muito a se dizer. É apenas nesta situação – da morte – que somos obrigados e precisamos abaixar a cabeça a aceitar. É só ali, mas é foda; é foda, mas é só ali.