quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

Happy New Year!


O estrangeirismo do título deste post não é gratuito, não. Mando, para os possíveis leitores, uma mensagem de final de ano enviada por Ali Tadjivid esta semana para mim. Com a devida permissão dele, traduzi o melhor trecho porque expressa justamente o que mais senti neste ano: a questão da consciência do mundo e de nós mesmos.

Ali foi meu professor no mestrado em Londres. O iraniano e eu nos gostamos de cara quando nos conhecemos, em 2000. Um café com ele durava umas seis horas, de tanto assunto. Mantivemos contato durante todo este tempo, e ele sempre traz um pouco da discussão britânica e iraniana para nossas conversas.
Ele é meu modelo de professor. Mais do que isso: Ali é quase poeta quando escreve sobre a vida.

A tradução perde muito do jeito com que ele joga com as palavras em inglês. Mas fica o recado. Viver é vida não é fazer o que se quer, mas fazer tudo com a devida consciência e alerta. Viver a vida requer pensar sobre a vida.

Que venha 2010 com tudo.
“As far as contemplating life is concerned, I think I have discovered something else about humans: we have a tendency to replace the concept of living with other words such as "studying", "working", "bringing up kids", etc. We use so many other words in order to explain "life". But "Living" is more than all of them put together. It requires a degree of awareness that emphasises the contingency of human existence and the value of the "present" - the ability to enjoy every second of our lives, whatever the activity, and love the ones whose lives are so intertwined with ours. We are always physically in the present, but the mind is either in the dead past, or the uncertain future.
So, I am left with only one motto: THINK life, LIVE life!”

“Considerando a contemplação da vida, eu acho que descobri outra coisa sobre os humanos: nós temos uma tendência a trocar o conceito de vida por outras palavras, como “estudar”, “trabalhar”, “ter filhos” etc. Nós usamos várias palavras para substituir “vida”. Mas “viver” é mais do que todas elas juntas. Requer um tanto de consciência que enfatiza a eventualidade da existência humana e os valores do “presente”: a habilidade de aproveitar cada segundo das nossas vidas, independentemente da atividade e amor dos que estão tão interligados com a gente. Nós estamos, fisicamente, sempre no presente, mas a mente está ou no passado morto, ou no futuro incerto.
Então, eu acabo ficando apenas com um lema: PENSE na vida, VIVA a vida!”

sábado, 26 de dezembro de 2009

Sorry, we are closed



JL do dia 23, anunciando o fechamento dos dias 24 e 25, retornando apenas na tarde de 26 com a edição de domingo, dia 27. E a Folha, do dia 24, avisando a ausência dos dias 25 e 26.


Não é brincadeira nem lenda nem boato. Meu aluno Auber, que tem um humor interessante, havia me contado que os jornais de Londrina não eram publicados em alguns dias dos feriados de fim de ano. Na hora, eu caí na gargalhada, juro mesmo. Fiz um paralelo na hora com aquelas piadas do português que não abre o restaurante no horário do almoço.

Mas é verdade. Folha de Londrina e Jornal de Londrina, o JL, não são publicados nos dias que circulam o 25 de dezembro. Eles ainda avisam, na capa, a futura ausência sem a menor explicação dos motivos, e desejando um feliz natal.

Como explicar isso em uma cidade como Londrina? Eu realmente não sei. Mas sei que, se isso acontecesse em BauruCity, o povo ia fazer piquete na frente do Jornal da Cidade e do Bom Dia. É feriado: dia de ler o jornal com calma, se informar, ver como estará o trânsito para a volta, conferir o horóscopo astral, o cinema, o que abre, o que fecha... Jornal é serviço, não é luxo. Precisa estar todo dia nas ruas.

Queria que alguém me explicasse o feriado jornalístico na pequena Londres. Não vou falar que eu, quando jornalista, gostava de escolher entre natal e réveillon, carnaval ou páscoa, mas é algo que nem se discute.

Mais do que uma piada, é uma pena.

quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

Manual para participar de uma banca:


- chegue antes. Absurdo deixar alunos, pais, amigos e professores esperando. Também tem o fato de que as apresentações de Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) ocorrem uma seguida da outra. Se atrasar uma, serão dois alunos, mais pais, amigos e professores na angústia da consolidação de um trabalho.

- se você for o orientador, faça o check-list: TCC, água para todos, ata da apresentação, declaração para as notas, equipamentos funcionando e, por favor, caneta. Já vi dois membros da banca, uma vez, caçando canetas com a plateia.

- elogie os colegas. Sei que parece hipocrisia escrever assim, mas é para elogiar mesmo. São várias razões: estão analisando, juntos, um trabalho; não estão ali por acaso, devem contribuir construtivamente. O elogio faz, sim, parte do protocolo mas carrega consigo a pressão para uma boa análise. Acredito piamente que todos os que dividem a bancada sabem e sentem o elogio que vem com carinho e admiração.

- elogie principalmente o aluno. Quase todos eles tem algo de bom ali. De 2003 pra cá, nas várias bancas de TCC por onde passei, apenas uma foi digna de começar com uma bronca deslava, daquelas de incomodar até o data-show. Também, eram dois alunos que se propuseram a fazer um documentário tendo como base as piores entrevistas que já vi na minha vida. Além da técnica pobre e incompetente dos dois, é claro. Quando isso acontece, não tem jeito. Vale extrapolar o tempo dado e realmente mostrar que aquilo ali não vale nada. Sem dó nem consideração com a família.

- saiba lidar com bancas diferentes porque, cada uma, caminha em um ritmo. Fico pensando quão diferente pode ficar a troca da ordem dos arguidores. Se o primeiro professor se esvai em críticas, pode ficar até estranho o outro só elogiar. O contrário também se aplica, e foi o que aconteceu na defesa da minha tese. Os três primeiros professores competentíssimos foram construtivos com suas arguições, mas, quando chegou o último, os comentários página a página foram surgindo de uma forma non-sense. Ou seja: não se deve ter uma fala isolada; as ideias do formando devem dialogar com a de seus avaliadores, em uma melodia que requer sintonia.

- esqueça da plateia sem desconsiderá-la. Não dá mesmo para pensar naquela avó que está toda orgulhosa da netinha, nem do pai político do aluno, muito menos no namorado bruta montes que te intimida com o olhar. Seja educado mas nem cogite mudar sua arguição por conta do mis-en-scene. O que importa é o trabalho, o aluno e o orientador.

- não discuta as escolhas da pesquisa, mas os caminhos que ela seguiu. Existe toda uma base nos trabalhos que não é de responsabilidade da banca avaliar. É o orientador que dá o tom da coisa, e isso nem se argumenta. Precisa tentar fazer uma leitura do trabalho, apontando reflexões, questionamentos e contradições que o caminho do trabalho possa apresentar.

- também não se deve, em hipótese alguma, fazer uma banca protocolo. Se você foi chamado para avaliar um trabalho executado, no mínimo, durante seis meses, faça sua tarefa. Quem faz aquela leitura besta, com comentários genéricos, deveria ser suspenso, como se faz com os alunos que não fazem seus deveres. Infelizmente, já tive colega de banca que confessou para mim ter lido apenas algumas partes, e pedindo algumas “informações” sobre o trabalho para não passar um carão. Que feio. Se não for ter tempo de ler, não aceite o convite para fazer parte de um dia tão importante da vida do aluno.

- não use perfume muito forte, batom exageradamente vermelho, roupa muito sensual ou pulseira cheia de penduricalhos barulhentos. E, se tem problema com gases, não tome coca-cola antes de ir. Uma vez, um professor soltou um mega arroto no meio da banca que, depois de uma brincadeira, até virou piada. Mas o cheiro ficou parado no ar condicionado por um bom tempo. Resultado: ninguém prestou atenção na arguição do moço. E a aluna de jornalismo terá, para sempre, uma marca nada cheirosa nem sonora quando lembrar da apresentação do seu TCC.

- defenda seu aluno quando precisar. Se alguém da banca começar a discutir exaustivamente algo desnecessário, de um aluno aplicado e fundamentado, erga a espada de São Jorge. O orientador sabe justamente o orientando que tem. Eu tive sorte de cair com duas grandes alunas-jornalistas nas primeiras orientações da UEL. Nem precisei defendê-las porque o trabalho falava por si só e porque elas sabiam muito bem suas escolhas e caminhos. É bom compartilhar com um aluno o orgulho do trabalho bem construído.

sábado, 12 de dezembro de 2009

Memorial

“Além disso, não precisamos correr sozinhos o risco da aventura, pois os heróis de todos os tempos a enfrentaram antes de nós. O labirinto é conhecido em toda sua extensão. Temos apenas de seguir a trilha do herói, e lá, onde temíamos encontrar algo abominável, encontramos um deus. E lá, onde esperávamos matar alguém, mataremos a nós mesmos. Onde imaginávamos viajar para longe, iremos ter ao centro da nossa própria existência. E lá, onde pensávamos estar sós, estaremos na companhia do mundo todo.”

Joseph Campbell, "O Poder do Mito"

segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Estranhamente feliz


A semana passada começou diferente. Na segunda-feira, ainda nem batia 7h no relógio e eu já estava na estrada, no caminho para Londrina. Vinha toda preparada: passei protetor solar número 50 até nas pálpebras, peguei a garrafinha de água tirada do freezer, dinheiro no bolso para pagar os 4 (QUATRO) novos pedágios que estão colocando no meu caminho, e a perspectiva de ir bem devagar para contornar o movimento de uma volta de feriado nas rodovias por onde passo.

O nublado quente de Bauru deu lugar a uma chuvinha gostosa que logo passou, e veio uma brisa deliciosa. Detalhe: passagem livre nos novos pedágios. Melhor: parecia domingo, quando a estrada tem poucos carros e caminhões. Teoricamente, era a volta de um feriado, mas, para mim, parecia ser o próprio – e ainda com um ventinho gelado. Foi ótimo, mas estranho.

Entrei no meu apartamento e senti uma coisa ruim. Entre tantas idas e voltas, sempre quando entro em Londrina e piso no meu cantinho daqui, fico tranqüila. E, dessa vez, senti uma tristeza... Um sentimento diferente que ainda não sei gramaticar.

Depois foi a cachorra, que definitivamente não está bem. Acho que é psicológico ou psicossomático, não sei, mas a bichinha está estranha. Fora os problemas físicos que ela vem tendo ultimamente, ela deu de se esconder embaixo da minha cama, fica andando inquieta pelo apartamento, os pelos estão caindo, brincadeiras ficaram estabanadas e está com um olhar inquieto que nem Freud justificaria.

Na UEL, um clima tenso de eleição do nosso departamento, fechamento de semestre, correção de Trabalhos de Conclusão de Curso e mais tantos detalhes que envolvem de uma forma meio injusta os recém-chegados como eu. Parece panela assoviando.

Outra coisa que pode explodir a qualquer momento é meu apartamento. Detectei um possível vazamento no banheiro, a persiana que pouco funciona, lâmpadas que queimam rapidamente, uma vizinha que adora me atormentar, um aparelho de DVD que eu não consigo ver funcionar e uns barulhos estranhos que mais parecem de fantasmas. Até Shú estranha e cheira as paredes insistentemente.

Acho que fiquei de mau humor com tudo isso. Alguns alunos, em reuniões de pauta, me fizeram gargalhar gostoso, mas meu semblante parece carregado, eu sei. E todos perguntam. O que aconteceu? O que você tem? Está tudo bem, Má?

Estou cansada, exausta, não tenho férias há cinco anos, saí de um pique e entrei no outro, ainda não estou bem acomodada em Londrina, tenho muito trabalho para ser finalizado até dia 23, estou dormindo pouco, uma dor de cabeça que gostou de mim, pendências emocionais para resolver, o desgaste da estrada...
São vários os motivos que podem nos puxar para baixo.

Mas eu tento, e tento, mostrar como estou bem. E estou, apesar do franzido registrado na testa.
É que algumas felicidades, mesmo tão felizes, vem revestidas de preocupação.

domingo, 22 de novembro de 2009

O forno e suas possibilidades

Coisinha fácil de fazer, e para quase toda hora. Pode acompanhar qualquer comida, virar um apetizer ou um antipasto para deixar curtir até o outro dia. Aliás, berinjela é que nem pizza: fica ótima no dia seguinte.
Dá para calcular uma para cada pessoa que for comer. Corte as berinjelas ao meio, verticalmente, e pique cada metade em pedaços do tamanho de um dado. Jogue em uma assadeira e misture bem com muito azeite e uns bons dentes de alho espremidos. Salpique sal e pimenta do reino, se gostar.
Leve ao forno, mexa umas três vezes com uma espátula, virando e deixando o aroma perfumar a cozinha. No começo, coloque o fogo alto, mas quando começar a assar, abaixe.
Para quem é mais light, depois de pronta, pode até escorrer em um papel. Para quem é exagerada feito eu, deixa arder, porque o azeite da berinjela vai combinar perfeitamente com um talharini, ou com um simples tomate cortado e queijo para comer com pão integral. Pode colocar de lado umas azeitonas, umas castanhas, acompanhadas de um bom Malbec argentino, e você tem uma refeição gastronomicamente praticamente completa. Talvez a abobrinha italiana, nesta mesma receita, também fique boa. Vou experimentar.

Os outros legumes também dão certo no forno, mas com outras artimanhas. Eu gosto de fazer batata, mandioca ou mandioquinha (que é chamada de mandioca-salsa no Paraná) embrulhadas no papel alumínio com um pedaço de manteiga. Dá para colocar em temperatura máxima e ir tomar banho tranquilamente. Quando ficam prontas, é só jogar sal e pimenta do reino, ou até arriscar um queijo - qualquer um.

Comida de forno é prática, saudável e não suja muito talher. É para se explorar.

20 de novembro

Data importante: aniversário da minha mãe. A escorpiana nasceu em 1934, com uma família já grande, na rua Cussy Júnior, perto da, agora vendida, sede central do BTC. Sob o som das rádios de Getúlio Vargas e às vésperas da segunda guerra mundial, Norma Neme veio para trazer alegria e desafiar diversas pedradas.
Sempre foi a palhaça dos irmãos, a confidente, a organizada e a baladeira também. Não perdia um baile e deixava os corações aos saltos com a elegância dela. Tinha 58 centímetros de cintura, imaginem só. Namorou um, dois, três, quatro pretendentes (todos, aliás, já morreram) até encontrar meu pai em 1967, e casar-se em 1969.
Foi quando a “nossa” pequena família começou. Na primeira gravidez, do menino que o marido tanto queria, ela sofreu, literalmente, um aborto espontâneo aos cinco meses. Meu irmão mais velho se chamaria Fernando, e tenho certeza que ele seria desses homens apaixonados pela mãe. Como todos que a conhecem.
Norma engravidou novamente. Veio a Mirelle, linda, forte, e trouxe a alegria para o casal. As fotos do meu pai e minha mãe com a pequena são de chorar, tamanha a alegria deles. E eles continuaram. Um ano depois, minha mãe estava de barriga de novo. Em junho de 1972, nasceu a Milena, um enigmático serzinho que abalou as estruturas.
O “pediatra” que “explicou” a síndrome de down para os meus pais – que não faziam nem idéia do que era – disse que a filha deles nunca andaria, nunca falaria e que dependeria deles para absolutamente tudo. Mesmo com pouca grana, tiveram a orientação de psicólogas desde o início, o que mudou a previsão apocalítica e ignorante do médico.
Em 1973, minha mãe engravidou novamente – mesmo tomando pílula. O médico dizia que ela não podia nem chegar perto da cueca do meu pai, de tão fértil. Mas a gravidez assustou. Norma já tinha 39 anos, e a família temia a possibilidade de nascer outra criança com limitações. Todos a aconselharam a tirar o bebê, mas o desejo de ter outra companhia para as duas meninas era mais forte. Corajosa, a minha mãe. E eu nasci, com 4,850kg.
Nossa infância foi difícil para minha mãe, que se equilibrava com a falta de dinheiro e as exigências de estimular a Milena. Nossa casa era um playground, cheio de brinquedos educativos para desenvolver a filha do meio. Aos três anos, ela começou a andar e logo foi soltando suas palavras cheias de vogal. Mérito da minha mãe.
As duas outras meninas também deram um bocado de trabalho. Mirelle teve várias pneumonias quando criança/adolescente, e eu era um moleque, sempre de braço quebrado ou arranhões das partidas de “queima” na rua.
Quando eu tinha uns 14 anos, Milena teve seratocone no olho direito. E este seria um dos maiores sofrimentos para minha mãe, que acompanhou os três transplantes de córnea e as internações infindáveis em Campinas que atravessaram alguns anos. Mesmo assim, a filha perdeu totalmente a visão de um olho. Uma revolta que permeou todos nós, e que regrediu a evolução comportamental da Milena em vários anos...
Tentamos, depois, internar a Mi em uma escola famosíssima em Betin, Minas. Preparamos todo o enxoval; achávamos que era o melhor para ela. Meus pais a levaram de Del-Rey, a deixaram na escola, foram para o hotel dormir e passaram a noite toda chorando. Os dois. No dia seguinte, bem cedo, voltaram para resgatar a filha e levá-la de volta para Bauru. É indescritível lembrar da emoção de ver o carro entrando na garagem, com a Mileninha no banco de trás.
Anos e anos mais tarde, com as filhas já adultas, minha mãe enfrentou seu maior medo. Teve o diagnóstico de câncer, a tão temida palavra. Cheguei de Londres, em 2001, e logo estava no hospital com ela, para a cirurgia que tentou tirar o máximo de nódulos do linfoma que a atordoava. Depois, começou a quimio, que puxou minha mãe para baixo. Ela não se conformava com o cabelo caindo, com a doença, com os exames que mostravam como ela estava fraca... Brigou com Deus, brigou com o mundo, e pouquíssimas coisas a faziam feliz, apesar da previsão de cura completa.
Nas vésperas da última sessão do tratamento, porém, uma médica descobriu um nódulo na mama direita. Exames depois, estava confirmado o tumor, que deveria ser retirado logo. A previsão de um famoso mastologista de Bauru era péssima: talvez, tiraria a mama toda. Eu o odeio até hoje. Levamos mamãe para São Paulo, onde achamos um médico muito gente boa que abriu o céu nublado. Tirou um quadrante, deixou o peito dela lindo, mas recomendou o tratamento nada agradável. Quimio, novamente, e radioterapia. Norma ficou pior ainda de humor, triste, reclusa, machucada e amargurada.
Ano passado, recebeu “alta” completa dos médicos. Está totalmente curada.
Em 2003, outras notícias mudaram a vida dela. Primeiro, eu e Mário nos separamos. E ela sofreu pacas. Minha mãe via o genro como um filho. Má era atencioso e amigo de Norma. Logo depois desta perda, veio o maior ganho, maior presente, maior benção: Mirelle engravidou, e minha mãe conheceu sua primeira e única neta.
Laila é a paixão da minha mãe, por quem ela faz quase tudo. Digo “quase” porque Norma é um ser que cuida de várias pessoas. Não deixa um parente, funcionário, vizinho, o marido, nem uma filha desatendida quando precisam. Talvez seja porque, a cada ano, ela adquire uma nova habilidade, novas modernidades. O aniversário de 75 anos, por exemplo, foi comemorado com o segundo furo para brinco em cada orelha que ela fez recentemente. Ficou um charme.
Apesar de ser muito amorosa, é uma escorpiana nata, que sabe se defender quando precisa... É passional como uma adolescente. É sorridente como uma criança. É amiga e mãe como poucas conseguem ser. É motivo de orgulho e de segurança para uma filha apaixonada.

Ps. Não dá para esquecer que a mesma data é aniversário do querido bar Armazen e do inesquecível lançamento do jornal BOM DIA.

terça-feira, 10 de novembro de 2009

Ménage à trois

Sexta-feira, 18h45, na bela rodoviária de Londrina, eu me vi absolutamente tomada pela emoção de receber meus amigos na minha nova cidade. Na noite anterior, não teve sono que me ganhasse. Uma ansiedade que eu não me aguentava, povoada de preparativos, comprinhas e possibilidades de passeios. De tão agitada, fui comprar um açúcar branco normal, para nosso café, e acabei comprando aquele especial, tipo confeiteiro.

Na rodo, corri atrás de todo e qualquer ônibus da Garcia. E são vários por minuto. Todos devem ter pensado que eu estava esperando um namorado apaixonante; os motoristas riam do meu ir e vir. Quando o carro que vinha de Bauru estacionou, dei um abraço triplo no Fabrício e na Paola lindíssimos. Eu já sou sortuda de tê-los, mas recebê-los foi ainda mais gratificante. Pazinha abraçada com seu travesseiro, ainda sonolenta, e Fá acordadíssimo admirando a arquitetura da rodoviária.

Paramos no Pátio São Miguel e a primeira revelação: Fabrício me mostrou a importância e singularidade dos ferros retorcidos que contornam aquela bela esquina. Na descida para minha casa, mostrei os bares, e os dois já se apaixonaram pelo querido vizinho tailandês, Varanda.

Descemos em casa para deixar as coisas, tomar um banho e brindar com o Santa Cristina que eu havia comprado. Santa Cristina é o vinho da Pá, o vinho do pai dela que aniversariava naquele dia 6, o vinho dos momentos especiais com a italiana... O brinde com o bom vinho mostrou o que seria o final de semana: saboroso, especial e bem encorpado.

Levantamos das cadeiras e fomos para o Varanda a pé. Lotado. Gustavo, que nos atendeu, previu umas cinco pessoas na nossa frente. Deixamos o nome na lista, mas descemos para pegar o carro e tentar o Bar das Meninas. Não demorou muito para Londrina querer “se mostrar” para meus amigos bauruenses. Caiu aquele toró com o qual os paranaenses são acostumados.

Ficamos esperando parar um pouco a chuva para descer. Não parava. Íamos voltar para o Varanda quando vi o Tomate Seco com um lugar para estacionar na frente. Propus, eles toparam e descemos. Eu não conhecia o lugar, mas adorei de cara. É o que o Fabrício falou: jantar uma bela massa ouvindo uma banda de rock ótima foi perfeito para inaugurar a primeira noite em Londrina.

Sábado, fui levá-los para passear e comprar vinhos. O spot principal foi o Mercadão Shangrilá, lugar que eu admiro cada dia mais. Semanalmente eu passo por lá, mas no sábado, e com meus dois amigos, o lugar ganhou outros tons e cheiros. De lá, passamos no Mercado Guanabara, mas a chuva não deixaria o DJ tocar. Nem pensamos duas vezes: fomos para minha casa deixar o carro e subir a meia quadra que me separa do Varanda.

Que lugar, que tarde, que cardápio, que atendimento, que gente bonita, quanta simpatia, que som bom, que Bohemia Oaken perfeita, que comida... Os dois se apaixonaram de cara e já decretaram: o nosso sábado seria ali mesmo.
Fabrício não acreditou que poderíamos fumar na mesa. Paola ficou embebecida com tanto homem bonito e variado. E eu não acreditava que o belo bar/restaurante, que visitei – com sucesso - umas duas vezes, poderia ficar ainda melhor. Chegamos no começo da tarde, pegamos a melhor mesa de todas, em vários sentidos, e não largamos dela até a noite. Conversamos sobre tudo, rimos muito e fortalecemos ainda mais a amizade e a certeza de que eles voltarão a me visitar.

Mas a italiana não aguentou tanta emoção e sono. Foi dormir em casa. Fá e eu ainda ficamos lá, conversando, conhecendo gente e descobrindo mais coisas boas sobre a querida-por-todos-Londrina. Fechamos a conta felizes e satisfeitos com a cidade. A balada já havia sido feita.

Chegamos e ainda batemos papo até outras horas. Pá acordou, dormiu, acordou... A chuva veio geladinha, e continuou até de manhã, quando fomos tomar café na Pandor que, estranhamente, estava fechada. Levei-os ao Pátio, que ainda tinha alguns remanescentes da festa à fantasia Metamorfose. Tomei um dos melhores cappuccinos da minha vida, que leva o nome da loja de conveniência que nunca fecha. Todos saímos satisfeitos direto para a estrada. Nem a chuva nem o apartamento apertado estragaram o final de semana.

Na nossa “mistura a três”, só faltou mesmo a Laura. Pá veio meio dormindo meio acordada. Fá e eu tagarelamos o tempo todo no caminho entre as duas cidades. Quando avistei Piratininga, diminuí a velocidade. Não queria chegar porque não queria que acabasse.
Mas não acaba.

sábado, 31 de outubro de 2009

Identidade


Descobri um dos melhores cantinhos em Londrina. E, por sorte ou destino, é só dobrar a esquina da minha casa para chegar nele. É uma cafeteria, por fora e por conta do nome. Caramelo Café. Uma construção comprida, não muito grande mas com pé direito alto, um mezanino lá dentro, recuada no terreno para abrigar algumas mesinhas na frente para os fumantes que recebem até cinzeiro. Ao menor contato com o cardápio, você percebe que está em lugar especial. Tem cafés, bebidas, massas, filés, arroz, feijão, sobremesas, salgados, sandubas e até cestas com bebidas e petiscos... Fora as prateleiras nas paredes com vinhos sul-americanos e cervejas das mais variadas, coisas que eu nem conheço. Sempre tem uma trilha sonora leve, como Beatles e John Pizzarelli, tão baixinho que só percebe quem quer sorrir. Aí, os donos vem te atender. Um casal porreta que te olha nos olhos, que é do bem e te oferece uma conexão de internet para ninguém botar defeito. Pensei em como eles eram “profissionais” com o que fazem, mas logo me corrigi. Eles gostam e sentem prazer em nos servir, em cuidar de um cantinho de tão bom que dá gosto de frequentar. Dá para perceber que é natural dos dois, que eles acreditam naquilo tudo que eles vendem e fornecem. Até agora, já parei umas vezes com a Shú, para sentar e tomar um mate gelado, já que eles permitem a minha cachorra nas mesas de fora, e degustei os cafés e cappucinos. Mas também é um lugar para se terminar uma tarde, trabalhando ou interagindo com o notebook, e ainda fumando um cigarro sem ninguém olhar feio. Precisa mais? Tem gente que acha sua vocação e consegue, sem nem saber, ser uma referência para quem se sente sozinha no meio de uma multidão.

quinta-feira, 29 de outubro de 2009

Quem não comunica...


Balanço da Semana de Comunicação da UEL:

- incrível a disposição e força dos alunos. Levaram palestrantes ótimos e variados, organizaram tudo e ainda fizeram uma cobertura online. O ótimo blog Londripost, criado pelo aluno Vitor como trabalho de conclusão de curso, participou das palestras passando informações pelo Twitter e encaminhando as perguntas dos alunos que não puderam ir, ou de outros “seguidores” do blog. E isso trouxe uma dinâmica interessantíssima para os debates. Tanto que, com eventos ocorrendo simultaneamente, a não-cobertura do Londripost em algumas palestras fez falta.

- conheci gente incrível. O Zezão, um radialista de 64 anos que trabalha desde os 13 no rádio. Diego Prazeres, editor de esportes do JL. Tony Hara, filósofo, jornalista, historiador, radialista, elétrico, casado com a Patrícia Zanin... E os interneteiros da cidade: Cláudio Osti e Nelson Capucho. O primeiro faz, sozinho, o debochado blog sobre bastidores “Paçoca com Cebola”. Figuraça. Não conseguiu responder uma pergunta sequer sem fazer uma plateia de mais de 60 alunos morrerem de rir. Eu, inclusive. Absurdamente realista e sincero, discutiu ética e teoria da comunicação fácil fácil. O amigo Capucho, que faz o famoso e importante site Londrix, mostrou a mesma tranquilidade ao falar sobre a nossa profissão. Homem vivido, de ótimo humor e muito carinhoso na sua fala, ele foi um dos mais críticos e preparados. Levou jornais antigos de Londrina e ainda distribuiu alguns exemplares do seu livro de poesia.

- ouvi bastante os termos “antigamente”, “na minha época”, e os jargões que usamos para falar sobre nossas experiências que indicam que somos de outra geração. Percebo isso em mim e na fala dos jornalistas que participaram do debate. Falamos do “gilette press”, do vinil que ocupava salas e salas nas rádios, dos laboratórios de fotografia nos jornais, dos longos textos, do aparato para se entrar ao vivo em uma programação, das dificuldades que detestávamos e, aparentemente, adorávamos... O relato romântico do passado dá sentido para a nossa memória.

- a palavra de ordem, em todos os debates dos quais participei, é criatividade. Talvez o jornal não morra, talvez a minha geração pra frente esteja aprendendo a lidar com as novas tecnologias, talvez a decisão do STF em relação ao diploma de jornalismo não mude nada, talvez a internet possa mesmo ser nossa aliada nas possibilidades de criação, talvez ainda haja saída. Mas, hoje, na mesa-redonda que mediei, Zezão falou, sem pudores, uma palavra que motiva a criatividade: tesão. Jornalista sem tesão, realmente, não tem solução.

segunda-feira, 26 de outubro de 2009

Adjético

Acredito que o termo possa ser atribuído à minha singular tia Sônia em um de seus belos emails. Por meras questões de digitação, ela trocou o “v” do adjetivo por um “c”. Pronto. Eu li adjetico, sem acento mesmo porque a internet possibilita esta decodificação, adorei a palavra e elogiei minha tia professora de português. Achava que era um adjetivo sobre o adjetivo, mas ela retornou aos risos, explicando a troca de consoantes.

O tempo passou e eu continuo com a palavra na cabeça. Já gastei meu adjético vez ou outra para testá-lo, em diferentes situações, e ele parece ter um futuro promissor e acolhedor. Todos, até agora, aceitaram o adjético como uma expressão de eventos/coisas/pessoas/sentimentos carregados de adjetivos. Nem precisei explicar.

No jornalismo, não se “pode” usar aleatoriamente os adjetivos, na busca de uma suposta garantia de objetividade. Discuto isso exaustivamente com meus alunos. Realmente, não dá para absorver a linguagem de um policial e cravar um “deliquente” ou “meliante” ou “elemento”, adjéticos por si só. Mas a mera escolha de algumas pautas já questiona qualquer tentativa de imparcialidade. Falamos sempre de algum lugar, para um certo alguém. E é essa definição de público que, por vezes, nos concede a licença para usar e abusar do subjetivo.

O adjetivo cria, portanto, uma subjetividade e um elo entre as pessoas. É claro que você se arrisca pacas quando utiliza adjetivos para descrever, explicar, corrigir, conversar... Entra nos limites tênues do julgamento alheio e da qualificação em categorias. Mesmo assim, eu gosto de gente clara, objetiva, que fala sem medo e que pode, sim, ser adjética. Sem dó nem vaselina. Só com uma boa pitada de respeito...

Eu acho que sou adjética por natureza. Aliás, alguém na minha família 100% libanesa deve ter pulado a cerca, porque meus gestos, gostos e hipérboles são muito italianos. Mas é que não sei elogiar de pouquinho, nem gostar em prestações. Paola, minha amiga italianíssima, é a rainha da intensidade: quando ela gosta, ela ama; quando desgosta, odeia!

Pazinha adora adjetivos e, talvez por isso, deu atenção ao termo inventado. Escrevi um email para ela e, no meio, como quem não quer nada, soltei o meu experimental “adjético”. Na resposta, ela logo comentou que amou a palavra, que ainda não conhecia etc e tal. A amiga italianamente adjetiva a refeição apimentada que detesta tanto quanto o vinho italiano que ama.

Pessoas adjéticas fazem parte da nossa vida. Não são deslumbradas nem exageradas. Apenas acham a palavra ideal para se expressar. Tudo bem, às vezes acham uns vinte adjetivos de uma vez só. Mas, geralmente, verbalizam com o coração muito mais do que um registro de amor ou de revolta. Dá para se conhecer bem uma pessoa pelos seus adjetivos.

É, tia, quem diria que, ao trocar duas letras, você ia criar uma palavra tão importante na nossa língua. E uma palavra tão sua cara. Só mesmo a tia mais cheia de adjetivos.

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

A gripe X


Ruim demais é passar mal de saúde, quando o corpo reclama em diversos pontos, sem aviso prévio nem prescrição médica. A sorte é que foi em Bauru. É aqui que sei de cor e salteado o telefone da farmácia, tenho meu plano de saúde, chego em qualquer hospital sem mapa, conheço minimamente os médicos... Fora os meus pais, a poucas quadras de mim, e meus três grandes amigos, que valem por uma metrópole.

Era para ser aquele final de semana em Bauru, com irmã e sobrinha e, pela primeira vez, eu e Shú viemos de carona. Chegando, fui ao Templo comemorar aniversário da cada-ano-mais-bela Laura - com Paola, Fabrício, vinhos, aperitivos, brindes, talha T, risoto de funghi e rocambrócolis (é uma peça de filé enrolada com brócolis, alcaparras, molho branco, tostado no forno, coisa de louco...). Até eu comi umas lasquinhas de carne, deixando os amigos perplexos. Voltei no tempo, no Templo de quando eu era bem nova, quando comia carne, quando descobri aquele restaurantezinho de personalidade, manias e um charme sem precedente na cidade.

O sábado de família terminou em uma noite de chuva e febre, que já veio alta, 38,8 caindo para 38,2 graus depois do antitermal, parando no 37 e pouco e oscilando o dia todo. Transpirei horrores, náuseas e acabei indo ao hospital mais perto daqui. Conhecia o cardiologista pai do plantonista que lá estava, mas que mal olhou para minha cara. O infeliz parece que queria almoçar, e, ao olhar minha ficha, falou: “é fumante, né?”, como se isso explicasse tudo. Ouviu, literalmente, duas vezes meu pulmão, mandou eu tomar uma injeção doloriiiida e procurar um infectologista. “Pode ser pneumonia também”. Revoltante. E, em todas as paredes do hospital, os cartazes da gripe H1N1 do Serra explicando e assustando os impacientes.

Passei um domingo detestável. Frio, calor, náusea e uma dor no corpo que parecia que eu havia feito várias aulas seguidas de body-pump. Dor de cabeça, enxaqueca, e a Mirelle e Laila tiveram de ir. Fiquei aqui, com a cachorra, sem carona para Londrina. A coitada terá de ficar sozinha quando eu for de busão. Liguei para o colega da UEL responsável por estes assuntos. Na sexta, eu havia ficado no estúdio de rádio com vários alunos, ar condicionado ligado e porta fechada a manhã toda. Preocupei com a turma.

Segunda cedo, fui a médico que parecia ser de verdade. Já me botaram uma máscara, fizeram o exame e, em menos de uma hora, saiu o resultado. Negativo para a gripe A. Ufa! Eu já vinha engasgada com essa gripe há tempos. Mudou minha vida, o calendário, da UEL, bagunçou o semestre, cancelou férias, assustou colegas e pessoas de Bauru, inclusive uma amiga querida grávida... Recentemente, fiquei mais enfurecida ainda porque minha mãe, com suspeita, precisou tomar Tamiflu. E eu em Londrina, também preocupada.

Vivi o fantasma da gripe A desde que ela apareceu. E ele consegue ser um serzinho que desperta um sentimento tão solitário quanto coletivo. É fantasma mesmo: fica atazanando a cabeça da gente. No delírio termal do meu corpo, oscilei entre me preocupar com os efeitos (comigo e com os outros) ou fazer vistas grossas para as consequências e voltar para minha casinha paranaense. Mas quem é jornalista, e pesquisadora, sempre pensa nas relações que se envolvem em torno de um fato.
Pessoalmente, virei pauta própria. Faço parte da turma que teve gripe X.

domingo, 11 de outubro de 2009

Ideias de elevador



Dos seis apartamentos onde morei, apenas dois tinham elevadores, e eles não faziam muito parte da minha vida. Foi pouco tempo de convivência com o sobe e desce até eu me mudar para Londrina. E para o oitavo andar.

Acontece que o elevador daqui é peculiar. Primeiro: tem câmera, fato que, inicialmente e burramente, eu não sabia. Aprendi a duras cenas. Segundo porque rola um tempo ocioso naquela cápsula, o que faz você conhecer alguns vizinhos.

Eu raramente consigo ficar em silêncio. Acho estranho aquele climão de duas pessoas apertadas em um minúsculo espaço sem ter o que fazer. Aqueles dez segundos viram uma eternidade e, se a pessoa se mantiver calada, eu espontaneamente vou soltar uma função fática. O espelho, aliás, deve servir para ampliar o quadrado e para proporcionar uma atividade para os silenciosos moradores - quase todos se olham no espelho.

Na Inglaterra, o problema não é tão evidente, visto que os elevadores lá praticamente falam. Ficam avisando o tempo todo as suas ações: doors opening; first floor; doors closing; second floor... Sempre achei a característica simpática e, claro, democrática com o colega deficiente visual.

No Chamonix de Londrina, são vários apartamentos, muitos moradores e uma população flutuante igualmente significativa. Alguns são freqüentadores natos do meio de transporte vertical, com horários parecidos com os meus; outros, acho que nunca mais verei porque estavam apenas de passagem. E tem gente com cachorro, como eu, e já rola uma empatia mútua instantânea. Curiosidade dessa amizade: conheço os donos, conversamos, mas só sei mesmo o nome de Rebeca, uma fox minúscula e gente boa, e Nina, uma lhasa cabeludinha e dentuçinha. E eles só cumprimentam nominalmente a Shú, claro, que prefere os humanos do que os caninos. Minha cachorra me deixa até sem graça, de tanto que despreza as tentativas de amizade dos outros peludos.

Os elevadores são cheirosos pela manhã, em uma mistura de vários perfumes, sabonetes e cremes de barbear. Pode-se até sentir um aroma morno de pão, vez ou outra, visto que tem uma padoca na esquina de casa. Mas já tive o desprazer de ver uma bituca de cigarro ali, no chão, assustadoramente no mesmo espaço que eu. Também fiquei presa, em um final de tarde, com um pernilongo, o que não foi nada agradável nem bonito de se assistir pela câmera.

O que poderia rolar é um som ambiente. Sei lá, deixar ligado na UEL FM. Dá até um bom slogan: “a rádio que te transporta... verticalmente”. Ou, melhor ainda: lançar um JE, Jornal do Elevador, mural, com notícias elaboradas para quem mora na cobertura, e notinhas rápidas para os habitantes dos primeiros andares. Ninguém nunca pensou nisso, não?

sexta-feira, 2 de outubro de 2009

Vermelhitudes

O fim de tarde hoje em Londrina foi belamente vermelho. Saí com a Shú e senti a quentura paranaense na minha pele; voltei para casa e vi o pôr-do-sol alaranjado esquentando minha inquietação. Mesmo assim, era bonito vê-lo deitando lentamente na cama avermelhada da terra daqui, da terra que tinge. Entrava pelo arranha-céu dos prédios que me cercam e buscava uma fresta para entrar na minha pequena sala. Entre as persianas que não entendo, nem domino, as luzes quentes conseguiram chegar até meu corpo. Eu deixei. Sempre deixo. O sol esquenta meu coração quando está vermelho.

quinta-feira, 1 de outubro de 2009

pela metade

"A porta da verdade estava aberta, mas só deixava passar meia pessoa de cada vez. Assim não era possível atingir toda a verdade, porque a meia pessoa que entrava só trazia o perfil de meia verdade. E sua segunda metade voltava igualmente com o mesmo perfil. E os meios perfis não coincidiam. Arrebentaram a porta. Derrubaram a porta. Chegaram ao lugar luminoso onde a verdade esplendia seus fogos. Era dividida em metades diferentes uma da outra. Chegou-se a discutir qual a metade mais bela. Nenhuma das duas era totalmente bela. E carecia optar. Cada um optou conforme seu capricho, sua ilusão, sua miopia."

A Verdade. Drummond.

Dei de procurar poetas na internet.
Sem o livro, parece meia poesia.

Tô brava



Agora, as crianças especiais devem frequentar escolas regulares para estimular a inclusão. Com certeza, a autora do projeto do Ministério da Educação (que dizem ser londrinense) não tem filhos nem parentes portadores de deficiência. Acho até que a bandida nunca deve ter pisado em uma APAE para saber que essa possibilidade não existe para a maioria – a megamaioria. Vamos além: o que será feito com todos os profissionais que trabalham nesse modelo de escola especial, e quais são as escolas públicas preparadas para atender as crianças? Sim, porque muitas vão passar a vida toda deliciosamente na infância.
Minha irmã é um caso. Tem 37 anos e um jeitinho de menininha que sempre nos surpreende com uma nova palavra, uma nova mania... Apesar de ser bastante independente, Milena morre de medo de andar em lugares desconhecidos sem o apoio de alguém, já que ela não enxerga de um olho. Mas, como é corajosa e saideira, segura forte na mão de quem estiver junto e mete bronca. Vai até de ônibus com os colegas downs e com deficiências variadas, até a APAE, o que lhe garante uma autonomia sem comparação. Duas assistentes carinhosíssimas cuidam dos alunos durante o trajeto.
E é na APAE, e somente lá, que Mi sempre foi acolhida como a linda aluna especial que é. Freqüentou escolas particulares horríveis e sempre voltou para a APAE - desde 1986. Nunca fui de vangloriar os aprendizados escolares, até porque eles não existem, mas é na aula que Milena faz amizade, convive, briga, participa de festas juninas, de fim de ano, do dia das crianças... São várias professoras entre pedagogas, psicólogas, fonoaudiólogas, fisioterapeutas. Só na sala dela são umas três ou quatro para, no máximo, dez estudantes.
Queria saber qual escola regular vai oferecer isso a algum aluno especial. Até porque, os que não precisam de toda essa atenção já estão há tempos nesse esquema de inclusão. E, sobre isso, quem legisla é a mãe, a escola e a dinâmica que se estabelece entre as diferenças.

Para Mileninha e sua tchurma, não é o fim da APAE, apenas.
É o término da vida escolar e de uma independência social e afetiva que eles tem entre eles. E que, quem não entende, deveria calar a boca. Pura e simplesmente.

domingo, 27 de setembro de 2009

mal necessário

"Sou um homem, sou um bicho, sou uma mulher
Sou a mesa e as cadeiras deste cabaré
Sou o seu amor profundo, sou o seu lugar no mundo
Sou a febre que lhe queima mas você não deixa
Sou a sua voz que grita mas você não aceita
O ouvido que lhe escuta quando as vozes se ocultam
Nos bares, nas camas, nos lares, na lama.
Sou o novo, sou o antigo, sou o que não tem tempo
O que sempre esteve vivo, mas nem sempre atento
O que nunca lhe fez falta, o que lhe atormenta e mata
Sou o certo, sou o errado, sou o que divide
O que não tem duas partes, na verdade existe
Oferece a outra face, mas não esquece o que lhe fazem
Nos bares, na lama, nos lares, na cama.
Sou o novo, sou o antigo, sou o que não tem tempo
O que sempre esteve vivo
Sou o certo, sou o errado, sou o que divide
O que não tem duas partes, na verdade existe
Mas não esquece o que lhe fazem
Nos bares, na lama, nos lares, na lama
Na lama, na cama, na cama."
Ney Matogrosso

quinta-feira, 24 de setembro de 2009

UMA (minúscula) CASA, TÃO (singelamente) ENGRAÇADA...


PROBLEMAS DE MORAR EM UM APARTAMENTO MINÚSCULO
- Não dá para deixar nada desarrumado. Um prato na pia já é pia suja; cinco livros na mesa e uma bolsa desarrumam totalmente a sala.
- Cozinhar também tem limites – nem me venha com feijão ou peixe. Omelete e alho com cebola também só rolam se todas as possíveis portas estiverem fechadas.
- A cachorra pode ser um problema: quando ela gruda no meu pé, ficamos nos esbarrando. Fez xixi no jornal, limpo na hora. Sorte que é a Shú.
- Cadeiras e estantes viram um anexo do armário de roupas. Tudo vira mancebo.
- Trombo aqui, tropeço ali, derrubo alguma coisa... Os objetos aparecem na sua frente de uma forma mágica. E dá-lhe hirudóide.
- Inevitavelmente, participo da vida dos meus vizinhos. Discussões, gargalhadas e até banho. Imagino (e temo) que eles também sabem muito de mim.


E OS BENEFÍCIOS...
- Ligo a televisão e posso ouvir de absolutamente qualquer ponto em que estiver. Mesmo com a torneira aberta. Mesmo durante o banho. E nem precisa ser em alto volume, não.
- O ventilador acaba arejando quase todo o pequeno espaço. Se tivesse ar condicionado, era só botar no baixinho e isso aqui viraria um Canadá fácil fácil.
- Receber gente é bacana porque as pessoas ficam pertinho. Ninguém precisa parar de conversar para buscar algo na cozinha.
- Ao sair do banho, vou para o quarto e, ao pisar na sala, percebo que os cheirinhos de sabonete e hidratante perfumaram a casa toda.
- Quando preciso de alguma coisa, é só esticar o braço ou, no máximo, dar umas duas ou três pernadas. Tudo à mão. Tudo com muito esmero.

terça-feira, 22 de setembro de 2009

As imagens que me restaram


A Intervídeo fechou. Uma das locadoras mais antigas de Bauru, fez parte da minha infanto-juventude desde quando minha mãe comprou um videocassete Panasonic do Paraguai, um luxo na época. A atendente Andréa continuava lá, o dono Luís vendeu para outro Luís, mas a Intervídeo não resistiu ao aluguel do imóvel e, com certeza, a diminuição da locação dos filmes, agora assistidos via internet.

Recebi o email falando sobre a liquidação do acervo. Nem fiz lista, mas fui lá conferir com minha mãe. Encontrei Fabrício – o que era quase certo. Eu mesma nunca fui de comprar filmes para mim. Lá, porém, não tinha como resistir. Vários DVD´s estavam com o preço de uma locação: cincão. O resto, era 8, 10 ou mais reais. Mas os melhores já haviam sido vendidos, claro.

Consegui achar nove, que somaram 65 reais. A lista das novas aquisições, para quem quiser emprestado:

- Cidade Baixa: os três, Wagner Moura, Lázaro Ramos e Alice Braga, em um triângulo amoroso muito sensual. Lembro de alguns momentos, e vai ser bom re-re-assistir.
- “Coisa Mais Linda – Histórias e Casos da Bossa Nova”: não conheço, mas gosto de tudo que envolve o Rio de Janeiro entre as décadas de 50 e 70.
- Carne Trêmula: tem uma cena de sexo belíssima. Acho que comprei por causa dela.
- Hamlet (com Ethan Hawke): era o único shakespeareano que tinha disponível. E era R$ 5. Não tem muita qualidade, não. Se alguém quiser uma linda adaptação do Shakespeare, eu tenho a melhor: “Titus”, presente do Fá.
- “O Labirinto do Fauno”, do Guilherme Del Toro. De babar. Não tem como não gostar.
- “Amarelo Manga”, do Cláudio Assis. Da primeira e única vez que assisti, precisei parar a cena do abate de um gado porque passei mal literalmente. Não sei se consigo, mas quero encarar novamente.
- “Irreversível”: outro filme que abala qualquer estômago mais sensível. Duas cenas pesadíssimas e muito longas, que mexem comigo sempre que vejo. E já vi várias vezes – sempre passa no Telecine Cult. A primeira, do espancamento protagonizado pelo Vicent Cassel; outro do estupro da belíssima Monica Belucci.
- Wall-E. Aaahhh... Eva, Eva...
- E o mais caro de todos, dezlão, “Grease – Nos Tempos da Brilhantina”: sei de cor, cresci com esse filme na seção da tarde em uma época sem nem videocassete. Eu e minha irmã fazíamos as coreografias, e eu tentava aprender inglês nas músicas (única parte não-dublada dos filmes que iam para a tevê). Agora, tenho acesso a assisti-lo com áudio em inglês. Parece outro filme, mas que me transforma na mesmíssima menininha dançante sempre que John Travolta e Olivia Newton-John começam a encenar Summer Nights. “Tell me more, tell me more...”. Alguns filmes e músicas voltam o tempo da vida.

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

Ânimo resistente

Vim absurdamente feliz para Bauru ontem. Rodei cantando tanto pelas estradas que acordei meio rouca hoje. Ouvi zilhões de vezes Feijoada Completa, Aos Meus Amigos, Samba do Grande Amor, João e Maria e Vai Passar, que acorda até defunto. Não entendo de onde saiu tamanha animação, considerando que eu vinha de dias de pouco sono e muita animação na minha cidade paranaense querida. Não me incomodei nem com o sol irritante da estrada; ajeitei a blusa e a bermuda para aproveitar o bronze. Mas meu ânimo seria testado.
Passei na casa da minha mãe, conversamos bastante e fomos comprar o ingresso para o show do Ney Matogrosso. Em menos de duas horas, notícias ruins sobre a saúde de pessoas que conheço. Fiquei chocada com um primo de quarenta e poucos que teve um infarto ontem mesmo. Está bem, mas foi um infarto. Resisti, e investi uma grana para minha mãe assistir ao show sentadinha em uma mesa de quatro lugares. Pensei que meus queridos Fabrício, Laura e/ou Paola ocupariam as outras duas cadeiras, já que, no sábado, vamos ter um almoço na piscina da amiga italiana e já engatamos a balada de Ney à noite.
Quando finalmente cheguei na minha casa, a carga de energia positiva quase explodiu. Shú, que havia ficado aqui esta semana que fui para Londrina, quase surtou de tanta alegria ao me ver. Nunca a vi tão feliz, tão animada, querendo me lamber, abraçar, subir nos meus ombros e escalar minha cabeça. Chorou horrores. Uma fofa.
Descansei por meia hora para ir ao meu novo ginecologista. Quase não consegui acordar, e o fiz sob protesto e com um mau humor do cão. Troquei de médico porque o antigo, conhecidíssimo na cidade, vivia me aterrorizando para ter filhos, que o tempo está passando... O cara é um parteiro na cidade, e eu percebi que ele gosta mesmo de mulher grávida. O novo gineco é muito bom, atualizado e fez um exame que me chocou. É como uma ultrassonografia interna (que as mulheres sempre fazem), só que colorida e com televisão para eu acompanhar tudo. Muitas mulheres detestam esses exames, e acho que também não gostariam de ver tudo. Eu adorei! Vi os meus órgãos e fui elogiada por ter um útero bonito e saudável. Mas, pela primeira vez, vou precisar fazer uma mamografia, aquele exame que aperta o seio feito um tostex. Tudo bem. Eu já imaginava que estava na hora. Sem desanimar, Márcia.
Ainda deu tempo de esperar a Milena chegar de ônibus da APAE e pegá-la no colo quando ela desce, às gargalhadas, falando tchau para os colegas e fizendo: “tchau, vai com Deus, amém”. Mi sempre faz assim. Quero ver se fecharem, de verdade, as APAES. Já quase fiquei brava ao pensar nessa notícia que ainda está engasgada no meu discurso. Mas a gargalhada da Mica tomando banho apaga qualquer encucamento.
Ao voltar para casa, outra festa da cachorra, que achava que eu tinha ido para Londrina novamente. Depois, tive a alegria de conseguir conversar com Laura, Fá e Pá, mesmo que rapidinho. Detesto quando venho para cá e não falo com eles. Mas Laura me deu uma notícia que mostrou quão cansada estou e quase me irritou. O show do Ney não é sábado agora; é no próximo, dia 26! Melhor dormir. E bastante.

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

Pelo jornalismo quente


Sei que sou só elogios a Londrina, essa cidade que conheço há uns 20 anos e que me conquistou só agora. Passei e me matriculei na UEL, mas fiquei na Unesp. Depois, relutava sempre quando minha irmã rasgava elogios. Mas foi só ficar poucos dias para engressar na turma “Prozac” que adora o norte do Paraná.

Tanto amor não esconde seus defeitos. Preciso admitir que um problema me incomoda muito por lá: os jornais. Sempre achei que eram fortes, históricos, importantes. E eram. Mas estão passando por uma fase muito ruim, ficando quase parecidos com revistas em uma época que até o Jornal Nacional amplia as matérias ao vivo, quentes, para dar fervura à mensagem jornalística e ao casal, é claro.

Os dois principais diários londrinenses são os que mais me intrigam. O JL, por exemplo, é ótimo por ser formato berliner, gratuito e estar em qualquer lugar. Todos tem acesso ao jornal que faz parte do grupo RPC. A Folha de Londrina é mais antiga, mais tradicional, tem toda uma história de respeito no meio jornalístico. Mas as capas são frias, as pautas são geladas, as fotos não tem expressão e algumas matérias vem completamente incompletas, com uma única fonte... Aliás, tem mais Classificados do que textos.

Parecem dois gigantes, mas são de gelo. Semana passada mesmo, com aquela chuva absurda, o Jornal Hoje entrando ao vivo de Londrina, e os impressos daqui não fizeram a “ronda” dos prejuízos nos bairros, não mostraram em fotos da chuva e um deles nem mencionou que a UEL ficou sem energia elétrica. O texto era genérico, sobre a região Sul do país, São Paulo e as explicações para o mau tempo. Dia de chuva forte é difícil em qualquer redação. Desmarcam-se compromissos importantes para cobrir os torós tropicais.

A explicação para tal linha editorial vem do processo produtivo. Aparentemente, os jornais de Londrina fecham cedo mesmo. Plantão no sábado pode ir só até às 16h. Notícia de última hora é recurso apenas para o rádio, tevê e internet – meios bem sevidos na cidade.

Tento, tento, e não entendo como um impresso pode se dar ao luxo de ser concluído tão cedo, se considerarmos que é o meio de comunicação de massa mais velho (em todos os sentidos). Em Bauru, a concorrência acirra o esticamento do deadline, que é condicionado apenas pelas negociações com a gráfica e seus horários. Qualquer pauta agendada ou inusitada faz repórteres e editores pescoçarem no jornal (termo usado para esticar a noite na redação).

Um exemplo clássico da “cidade sem limites” é a morte da princesa Daiana, que fez o Jornal da Cidade parar tudo e ser o único impresso em Bauru (quicá do interior inteiro) a sair com a notícia, mesmo atrasando a entrega. Até a Folha de S.Paulo que vem para as cidades menores não publicou o assunto que dominou o dia inteiro no mundo todo.

Eu mesma já me segurei na redação por diversos fatos jornalísticos, ainda mais quando fazia a capa: Libertadores da América, vários outros campeonatos, sessão da Câmara Municipal, acidentes, assassinatos, prisões importantes, chuva torrencial e até show do U2. É natural no jornalismo. A notícia deve ser apresentada ao leitor de forma completa até o último momento possível.

Defendo, aliás, que todos os jornais exponham o horário de fechamento em cada edição. É mais honesto para quem faz e para quem consome os impressos. Mas quero ver qual tem coragem, porque não deve ser fácil convencer alguém a comprar, ao meio-dia, um jornal que fechou às 16h12 do dia anterior.

terça-feira, 8 de setembro de 2009

AO VIVO!


Primeiro radiojornal com o pessoal de jornalismo da UEL foi ao ar hoje. Aliás, acabo de sair de lá, mas, quando cheguei para começar o trampo, perto das 18h, parecia o caos. Pensei quão louca eu sou por aceitar algo que não é diretamente a minha área e, pior, para substituir uma professora que é unanimidade de competência e admiração no curso. Flávia Bespalhok nos deixou para a Federal do Paraná, mas fez tudo tão ajeitadinho que, com certeza, estava lá no nosso estúdio.

Guilherme era o editor-chefe. Gente boníssima e fumante, ele me ajudou pacas. Também tem a Soraia, monitora da disciplina e enturmada com o pessoal. André, técnico do estúdio, que tem uma tranqüilidade de quem nasceu no rádio – e nasceu - além do seu Luís, é claro, um belo senhor que nos auxilia no departamento. Tudo muito bem, eles todos ótimos e pisando em terreno conhecido.
Só faltava eu deitar e rolar.

Editores, repórteres, pauteiros, notebooks, fones de ouvido e cafés agitavam a sala de aula que fizemos de redação. Mas parecia tudo calmo, até demais, considerando a iniciante neurótica que sei que sou. Os problemas apareceram de paulada, como sempre acontece no jornalismo. 20h30 e ainda não tinha todos os blocos indo para impressão. Quando foram, só a primeira parte do programa foi impressa. Além disso, o aluno responsável por levar uma aluna-repórter para fazer uma das entrevistas ao vivo sumiu. Nosso radiojornal, o “Fôlego”, que frequentemente chamamos de “Sufoco”, é divulgado nos alto-falantes do CECA (onde fica o departamento) às 21h. Na corrida para botar tudo num pen-drive, imprimir o script in-tei-ro, fazer os espelhos, atrasamos 15 minutos do previsto. Fiquei pensando que Flávia teria infartado ali mesmo ou, mais provavelmente, não teria deixado o caldo entornar assim.

Vambora.
No estúdio, no início, todos tensos. Aí, entrou o primeiro “ao vivo” (quando o repórter vai até o local, eu ligo para ele, coloco na escuta, e fazemos a entrevista no ar). Quando terminou, todos soltamos um “aaahhh”, “iiiuuuhuuu”, “legaaal”, “yeees”, “maaassa” (acho que essa fui eu). Que energia boa! Entrei totalmente no ritmo adrenalínico do rádio. Programei o próximo “vivo”, liguei para a Mari que entrou no ar, entrevistou o cara ali, fechou a matéria, e mais gritinhos foram ouvidos no estúdio enquanto André colocava vinhetas comerciais (da Cremogema, bala de leite Kid´s, BomBril antigo...).

No terceiro bloco, um desafio. Faríamos um “vivo” na rua, e outro no estúdio, com o repórter entrevistando, pelo telefone, um jornalista que escreveu a biografia do técnico que mais tempo ficou no Tubarão (também conhecido como LEC, Londrina Esporte Clube). Com a energia exalando, o tempo das entrevistas deu super certo. Para não mentir, nosso radiojornal, que é programado para 50 minutos, ficou com 50’42” (linguagem de rádio para determinar minutos e segundos). Mega huhu! Flávia ficaria orgulhosa.

Depois dos gritos, os comentários das loucuras, os errinhos que já percebemos e que nos fazem rir num misto de tensão e satisfação que só jornalistas conhecem, Gabi veio tirar a clássica foto da equipe. Logo avisei que nosso sorriso não viria do “x”, mas do “Flaaaviaaa”, nome aberto de uma professora que foi minha banca no concurso, minha querida no departamento, e a mentora de tudo isso.

Duvido que, depois de tudo, vou conseguir dormir cedo para dar aula amanhã.
Tudo bem.
Fico no ar, feito uma radialista.

quinta-feira, 3 de setembro de 2009

O único timãããããão


Depois de dois dias intensos de trabalho e calor, um expresso no pátio São Miguel e dois cappuccinos em casa para me manter acordada, depois de dois Felipes goleiros incríveis, um a zero para o adversário, lances voadores de acelerar o coração, vinho para tentar me acalmar, meu Corinthians me fez gritar de doer a garganta com o primeiro gol. Decidi vir para o blog escrever. Comecei a digitar este mini-post (porém, um mega-twitter), mas parei para gritar novamente, ao som da comemoração na tevê e nos ares de Londrina, segunda maior torcida preto-e-branca. Quase 44 do segundo tempo, dois a um! Posso pedir mais? Os outros clubes podem ser bons, mas continuam um “grande time”. Só corintianos podem gritar no superlativo: “Timããããão”.

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Alunos virtuosos

Eles me animam, me instigam e, principalmente, me ensinam muito. Não aquela coisa chavão de que o professor aprende durante a aula – isso é fato. O lance é que meus alunos, cada vez mais, são minha fonte de informação para questões de internet. E olha que nem preciso perguntar nada. É automático, orgânico - mais para eles do que para mim, que desconheço o que a geração gadget acha natural.

Foram apenas duas turmas na volta às aulas da UEL e os alunos de jornalismo já me deram informações que eu desconhecia.

Um: todos, ou quase, tem twitter, essa ferramenta que, na minha balzaca opinião, já que nem conheço in loco a bagaça, serve mais para as pessoas públicas se autopromoverem do que para interagir com os amigos. Com um brother de verdade, a gente liga pra conversar ao vivo, manda torpedo de madrugada, elabora altos emails... Se esse texto fosse para o twitter, com seu formato de 150 caracteres, eu não terminaria nem a terceira frase.

Segundo: uma aluna querida me informou que, ao digitar meu nome, o google completava automaticamente. Fiquei assustava e fui experimentar. Márcia tem um monte, mas aí quando chega o Buz, eu apareço. Depois, tentei com o Neme, e também deu certo. Marcia Ne já é suficiente para eu ser googada por completo, com nome de mãe e pai.

Curioso é verificar até qual vogal ou consoante uma pessoa continua virtualmente anônima. Interessado? Pode ir lá. Tenho certeza de que vais googar a si mesmo e ao próximo, acertei?

segunda-feira, 31 de agosto de 2009

Meu eterno sofá


Trouxe para Londrina a minha bicama. Deve ter perto de uns 30 anos. Foi comprada pela minha mãe, mas eu não lembro onde ela ficava na casa antiga dos Neme-Buzalaf. Na residência atual, para onde nos mudamos quando eu tinha uns 11, 12 anos, serviu de sofá enquanto os almofadados da alvenaria não ficavam prontos. Só que a bicama era mais larga do que o gesso, e fazia com que as três filhotas ficassem com as perninhas abanando no ar enquanto assistiam tevê sem controle remoto. E dá-lhe jó-quem-pô para decidir quem ia mudar o canal.

Assim que as almofadas modernas chegaram, a bicama com estampa de floresta tropical ficou armazenada no quartinho de despejos da casa. Muitos anos e emoções depois, fui morar sozinha, e minha mãe me deu a bicama que, com uma manta, virou sofá. Puxa vida, foi meu primeiro sofá, o lugar onde recebia as pessoas, onde descansava depois das longas jornadas no Jornal da Cidade, meu cantinho para ler os prospectus do mestrado que queria fazer, preparar a papelada toda... Lá, ficou vivo até eu ir para Londres. Foi quando os dois colchões voltaram juntos para o quarto de despejos da família. Encostados, sem uso, mas sempre limpos pela Vicentina.

Voltei de Londres, fui morar com o Má em um belo apê, mas que não tinha espaço para o quase-sofá de cores gritantes. Continuou na casa dos meus pais. Sempre o olhava saudosa quando ia buscar um azeite, ou um refri na dispensa da Norma. Poucos anos depois, me separei e levei apenas o que já era meu: a geladeira, o fogão, a velha estante de livros e a mesa do computador (continuo com os mesmos). Aluguei o pequeno apartamento perto do shopping e peguei de volta a bicama, que foi um belo sofá no meu primeiro ano e meio de separada. Lá, eu me preparei para o doutorado, recebi amigos, conheci gente e montei muita aula para a Unesp e USC.

Quando mudei para o predinho, onde ainda moro em Bauru, levei a bicama mas logo comprei um sofá branco, que combinou com todo o resto. Ela voltou a ficar sem uso, armazenada no salão de festas do prédio, que funciona de depósito para nós, moradores. Nunca achei que deveria doá-la, já que seus dois colchões são firmes e fortes como nenhuma novinha seria. Roberto sempre me mantinha informada: “Coloquei sua bicama para tomar sol hoje”.

Eis que fui percebendo que estava faltando um sofá aqui em Londrina. Levar o meu branco, com três assentões, impossível. Comprar, também, não seria o caso – não foi por isso que aluguei um apertamento(sic) mobiliado? Lembrei da bicama, mas antevi problemas. Primeiro: não achei que ela dobraria a ponto de caber no meu carro (que tem a bunda encolhida). Mas coube certinho no banco de trás. Segundo: vim pensando que a dita poderia tumultuar ainda uma sala tão micro. Pelo contrário.

Eu tenho, agora, um sofá na minha sala que, incrivelmente, parece maior. Sentada perto do chão, a tarde está mais fresca, a Shú mais perto e tranquila, os livros aqui do lado e a caneca e o cinzeiro também. Fiquei melhor confortada aqui com minha bicama-amiga, e até mais feliz por dar vida a ela de novo.
Parece que esses dois colchões vão me acompanhar até, no mínimo, a aposentadoria.

quarta-feira, 26 de agosto de 2009

Dúvida jornalística


Notícia de ontem:

INTERNADOS COM GRIPE A CAEM 50%
Bauru registra diminuição de gravidade clínica da nova gripe; Secretaria de Saúde confirma mais nove casos da doença


Mas não seria mais ou menos assim?

BAURU REGISTRA NOVE CASOS DA GRIPE A
EM APENAS UM DIA
Apesar da diminuição de 50% dos internados, Secretaria de Saúde confirma diagnósticos e soma 73 pessoas com o vírus na cidade

Tucanaram os fatos ou eu que estou sensacionalista demais?

segunda-feira, 24 de agosto de 2009

Conjugando

Eu falho.
Tu falhas.
Ele falha.

Nós falhamos.
Vós falhais.
Eles falam.

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Fator-Neme


Este é o nome dado às características comuns aos membros da família da minha mãe. O termo foi cunhado pela minha prima Karen, uma Neme legítima, filha da amada tia Sônia, caçulinha dos nove filhos (cinco mulheres e quatro homens) dos imigrantes libaneses Alfredo e Sálua, meus avós, além de escritora da biografia deles.

Os Nemes são detectados de longe. Primeiro de tudo, tendem a ter um humor gostoso que acalenta mesmo os momentos mais difíceis. Exemplo recente: uma querida tia teve uma leve amnésia após uma longa cirurgia. Com a ajuda de suas filhas palhaças, pregou peça no meu tio, o chamando pelo nome do primeiro namorado dela. Tio Neto quase foi internado também, coitado. Nemes são sensíveis e ciumentos.

Na gastronomia, Nemes são tarados por ovo frito e por arroz branco, puro mesmo. Também caem em tentação quando veem uma manteiga em temperatura ambiente, principalmente se tiver um pão fresquinho para acompanhar. Adoram café, e fazem belos bules com pó assentado. Quando passávamos juntos as ceias, fim dos anos 70, início dos anos 80, era uma coisa de louco. Acho que nunca vou apagar da minha memória aquelas mesas apetitosas. Imagine que cada família levava uns dois pratos e você pode ter uma idéia da fartura dos lombos, carneiros, ráchuas, charutos, tahines...

Amam música, livro, poesia, filmes e televisão. Talvez seja por isso que Nemes são notívagos. Cantam as canções que gostam, e cantam alto, sozinhos ou para quem amam. Isso vem desde quando minha mãe morava com os pais e todos os irmãos. Todos cantores, claro.

Livro também faz parte da casa de quase todo Neme. Diferentemente de muitos imigrantes libaneses (como a família do meu pai), meus avós maternos conseguiram formar os filhos, que também formaram seus descendentes, e assim por diante e adiante.

Também são poucos os Nemes que você pode conhecer na vida que recusariam um convite para o cinema. Adoram o fascínio da telona e da telinha. Meu avô, inclusive, foi o primeiro a ter uma tevê a cores em Bauru, “causando” geral por aqui.

Outra característica dos Nemes que tenho detectado ultimamente: cachorros. Quase todos tem ou tiveram belos cães. A terceira geração, minha e dos meus primos, é quase toda canina. Mas um, em especial, teve importância singular na nossa história. Era Lord, um meio pastor, meio collie, dos meus avós e um pouco de todo mundo. Fisicamente, parecia a Lassie, só que todo negro. Ficava no fundo da grande casa da Cussy Júnior, e, quando se soltava, corria para os pés do meu avô, já na cadeira de rodas. Certa vez, Lord fugiu e ficou desaparecido por quase uma semana. A família toda se preocupou. Em um dia de aula de inglês, quando minha mãe me levava (eu devia ter uns 10 anos), vimos o Lord a poucas quadras de casa. Lembro do orgulho de subir a rampa da casa da minha avó com ele, e a carinha dela de felicidade pela volta do companheiro
.
Nem dá para falar que o fator-Neme está determinado pela lógica simplista do DNA, já que a terceira turma da nossa família, felizmente, tem filhos próprios e adotados (talvez outra característica genuína). E todos bem Nemes. Um dos meus primos mais velhos é o caso mais incrível: há vários anos, ele gerou duas meninas e um menino. Quando as crianças cresceram, adotou um menino. Gostou. Adotou, aí, uma menina. Depois, mais uma garotinha, e o casal finalizou a saga recebendo um sétimo filho.

Aliás, se fosse para reunir todos da segunda, terceira, quarta e quinta geração dos meus avós (juro que eu acho que já tem tudo isso de gente na nossa árvore), teria de fechar um clube. E seria o BTC, onde três levas de Nemes pularam muito carnaval. Neme, aliás, sempre gostou de uma folia.

Tem um tio Neme que eu não conheci, o gêmeo.
Tem Neme que eu ainda não conheço, mas já gosto. Tem Neme briguento, apesar de que todos somos um pouco passionais. Tem até uma rua em Londrina com nome de Neme... e uma Neme gente boníssima. Tem Neme no Paraná, em Bauru, no resto do interior, na capital e até na Califórnia. Tem uns Nemes que já se reuniram na Europa (Dani é a rainha: eu, ela e tia Evelyn nos encontramos em Londres quando morei lá, e ela sempre viaja com a Ká para Paris). Tem Neme famoso - um dos melhores médicos que São Paulo já teve. E tem Neme chato também, mas todo mundo sabe quem eles são. Tem Neme moreno, loiro, magrelo, gordinho, alto, baixo. Tem vários Nemes de olhos claros - e eu adoro fazer parte dos descendentes que puxaram para meu avô. Tem Neme misturado com italiano, espanhol e até japonês. Tem muitos Nemes que choram fácil - eu, inclusive. Tem poucos Nemes carrancudos - geralmente, sorriem bastante. Tem os Nemes que se foram nos últimos anos - os dois tios e a tia deixaram uma saudade cortante, mas a certeza de que nós éramos amados por eles. Neme tem dessas: quer ser carinhoso até de longe.

quarta-feira, 19 de agosto de 2009

Watch out what you wish for


Ela queria alguém de Áries. Traumatizou com os diversos capricornianos que haviam aparecido na sua vida; todos cartesianos demais. Pensou: se caminhar com um carneirinho feito ela, vai saber lidar melhor. Pronto. Em uma noite de verão, encontrou um ariano que virou sua cabeça. Viveram uma intensa história de amor e paixão, mas tudo que vibra muito, também dói no mesmo tanto. Aprendeu a olhar no espelho e ver seus próprios defeitos no outro bem-querer. Ficou triste, confusa, mas cresceu, e continua admirando arianos até hoje.
***
Ela queria uma história de filme romântico. Não rolou. Até casou com todas as pompas possíveis, mas apenas por insistência dela, que cantava, vivia e amava um homem que não era, nem de perto, o príncipe sonhado. E não é que o cara ainda virou sapo e pediu a separação? Ela caiu, levantou e continuou na busca do encontro perfeito. Infelizmente, só topou com canalhas da pior estirpe. Um, dois, três, quase quatro anos depois, havia desistido. Foi para a Itália curtir a vida solitária que já havia incorporado forçosamente. Encontrou um “princi” italiano, e vive uma Love Story à distância - mais romântico, impossível.
***
Ele só queria terminar aquele relacionamento... Tentava sempre, e sem sucesso, porque ela era doce e atenciosa. Também brigavam bastante, porque a energia já não estava mais lá. Mesmo assim, tinham muita paixão, e as discussões viravam sexo que apagava qualquer necessidade de terminar o caso verbalmente. Morriam juntos no orgasmo a dois. Ainda mais quando ela o recebia de minissaia. Em uma noite solitária, ele cedeu aos talentos de uma outra moça, sem imaginar que a mulher saberia de tudo. Mas soube. E terminou. E magoou. Mas terminou.
***
Ela queria se sentir amada. Havia saído de um relacionamento desgastante com um homem que deixou sua auto-estima lá embaixo. Chorou horrores, levantou, mudou o visual e partiu para a vida, a noite, conheceu homens e se entregou. Teve azar: cruzou com os mais neuróticos, que grudam feito chiclete e acreditam ter encontrado o amor da vida deles. Cansou e casou, sim, com sua criação de gatos.
***
Ele queria uma namorada japonesa... Sonho de infância, sem nenhuma explicação. Ficava fascinado pelos olhos e todos os atributos físicos e imaginários de uma gueixa. Conheceu a nissei da sua vida, e com ela viveu um relacionamento exagerado em todos os sentidos. Ela tinha altas psicoses, problemas profundos não-tratados e chegou a esfaqueá-lo durante uma briga. Agora, ele só gosta de loiras.
***

terça-feira, 18 de agosto de 2009

Minhas crianças


Ganhei dois meninos assim, de cara. E eles vieram depois de várias garotas.
Começou com a Laila, minha sobrinha, que agraciou nosso mundo há pouco mais de cinco anos. Aquela menininha linda, neném, toda cheia de enfeites das tias corujas que ela foi agregando ao longo dos seus passinhos, palavras, frases...

Depois, vieram as duas filhotas das minhas duas Dani´s. Gabi, no Canadá, e a Clara, minha querida, com quem convivo bastante, e que tanto adoro. Depois, veio ainda mais uma, a Giuliana, a segunda Gorlinha com cara de canadense.

Tudo muito lindo no reino das mulheres, e, considerando que sou a terceira de três meninas, lido bem com a coisa feminina. Mas eu sentia falta de um pintudinho. Um sobrinho para brincar de bola, levar xixi na cara... Deve ser porque fui muito moleque quando criança, ou porque gosto de um bom futebol, ou porque sempre pensei em ter um machinho.

Van e Fer trouxeram os dois meninos que eu já amava de longe, desde quando eles nasceram em Buenos Aires, há um ano. Fui acompanhando Caio e Nuno por fotos, vídeos e muita imaginação de como seria minha grande amiga mãe. E quem seriam estes dois seres que nasceram de uma junção tão bonita e desejada?

Ontem, eu os conheci.

Nuno ficou ali, pertinho de mim, com o olhar do tio Cássio, pai da Van, e um sorriso-meio-gargalhada de derreter qualquer metal resistente. Que menino charmoso, fofo, tagarela, aconchegante...
Caio, ah, que mistura mais rica da mãe e do pai. Anda feito um homenzinho forte, com seus braços abertos e sua cabeça erguida. Olha firme nos olhos da gente, o cabeludinho.

Dois leoninos na casa da Capitão Gomes Duarte, onde eu também cresci. O mais interessante é saber que, do mesmo jeito que vi a Van fazer 15, 18, 21, 35 anos, entrar e sair da faculdade, também vou acompanhar os passos dos gêmeos para o resto de nossas vidas. O mais emocionante? Ah, acho que foi sentir a forte ligação que se forma ali, naquele quadrilátero de amor.

A origem de Caio e Nuno também os enriquece. Fernando é de uma doçura e de uma calma quase mineira. É um pai e um companheiro que a gente sonha para viver com uma grande amiga feito a Van... Ah, e ela merece. Uma mãe tão menina, tão amiga, tão brilhante. Tem humor, inteligência e carinho de sobra. É das pessoas mais importantes nos rumos que minha vida tomou.

Agora, estou danada: além de sempre agradecê-la pela amizade e carinho comigo, terei de pagar pau porque Vanessa e Fernando me deram meus primeiros meninos.
E são iluminados, os quatro.

sábado, 15 de agosto de 2009

Meus cigarros

Meu médico adotou a linha do Serra: mandou eu parar de fumar. Pela primeira vez, o pesquisador do Hospital das Clínicas nem se deu ao trabalho de me explicar os motivos, e logo determinou uma sentença que eu sempre questiono e vou questionar por alguns motivos bem meus.

Primeiro de tudo: cigarro é prazer. Para os outros, é um vício imundo que polui o mundo e a saúde, mas, para quem gosta, é compartilhar, é companhia, ajuda na reflexão, alivia uma ou outra tensão. Faz mal para a saúde? Pois é, mas até o remédio que se toma para uma coisa acaba prejudicando outra. Aliás, viver faz mal à saúde.

Segundo: cigarro cria elos sociais. Bom, em redação de jornal, isso fica claro. Pessoas se aproximam por esta ligação. Geralmente, tem a categoria dos não-fumantes irritantes, dos que nem se incomodam, dos que sempre filam um trago e dos fumantes assumidos, sempre unidos.

No Bom Dia, a cumplicidade era no olhar: um se virava para o outro, mostrava o cigarro, o isqueiro, ou apontava para a porta, e, em dois minutinhos, a tchurma se agrupava no cantinho da calçada, sob chuva ou sol. Não precisava nem levar isqueiro.
Discutíamos tudo: pautas, vida, concorrência e até cigarro. Irmandade total. Eu e Sergião, editor de esportes do BD, costumávamos revisar as páginas fumando na lavanderia, dentro do jornal mesmo, depois das dez, onze da noite, quando já não tinha quase ninguém. Eu aproveitava as aulas de português dele, um verdadeiro mestre, e dividíamos o café e as preocupações.

Mas foi na redação do Jornal da Cidade que comecei a fumar, ainda que de forma tímida. Geralmente, era com a Lú, pauteira, quem eu via praticamente como uma editora, e que muito ensinou à “foca” aqui. Comecei pedindo um trago em alguma pauta nervosa, e terminei pegando um cigarro inteiro.
Também tenho outras histórias de aproximação motivadas pelo cigarro. 1998, eu em Nova York, comecei a comprar meus primeiros maços. Era uma segunda-feira, minha irmã havia ido me visitar, e eu a levei conhecer um bar de jazz no Village. Um holandês muito bonito e com sotaque gostoso chegou perto de mim e, no lugar de pedir “fogo”, queria apenas compartilhar o cinzeiro (“Can I share your ashtray?”). Alwin e eu namoramos o tempo que ficamos lá, e sempre lembramos do approach com muito carinho e humor. Aliás, nos tempos do Serra, soube que a cantada “você tem fogo?” está sendo trocada por “vamos fumar um cigarrinho lá fora?”.

A lei antifumo me limita, eu admito, mas isso já estou fazendo naturalmente. Introduzi o Free One na minha vida (eita cigarro besta), e tento não fumar mais tanto perto de quem não vai compartilhar o fogo comigo. Um amigo meu fez o contrário: passou do Marlboro Light para o Vermelhão, só de raiva.
Fiquei pensando nas situações de bar que viverei com alguns dos meus amigos - Fabrício (fumante), Paola (não-fumante) e Laura (não-fumante, mas simpatizante):
- eu, Pá e Fá. Se Fá e eu vamos fumar, Paola ficará sozinha na mesa. Se escolhermos uma das poucas opções de bar onde ainda se pode esfumaçar, Pazinha, coitada, será a única a não-fumar em um ambiente totalmente separado dos outros.

- se for eu, Fá e Laura, minha amiga austríaca vai se sentir compilada a virar fumante por uma noite, ou, muito provavelmente, repetirá a situação anteriormente descrita: sozinha ou esfumaçada

- se sair só com a Pá e com a Laura, sou eu quem vai fumar alone lá fora. Ouvi dizer que está rolando uma confraternização absurda entre fumantes no estado de São Paulo, que se reúnem, criticam a lei, viram amigos e até paqueram justamente na hora do cigarrinho.

- se for só eu e o Fá, aí que piora tudo. Será que perderemos a mesa quando formos dividir a brisa bauruense na calçada? Os bares fornecerão pulseirinhas para as pessoas poderem retornar ao ambiente público e límpido?

Se o cigarro faz parte da minha vida, só eu mesma que vou conseguir determinar quando parar. Nem doutor Paulo muito menos, mas muito menos mesmo, o tucano José.

sexta-feira, 14 de agosto de 2009

Sim, estou ficando velha


Quero rotina, horário, tudo funcionando.
Quero geladeira cheia, frutas no ponto e algumas para madurar semana que vem.
Quero agendar minhas viagens; curto, médio e longo prazo.
Quero fazer um esporte fixo, com metas e programação.
Quero programar mais encontros familiares – sou uma ameba nesta área.
Quero poder querer a longo prazo.
Quero contas no débito automático, TV a cabo funcionando, assinatura de um jornal e de uma ou mais revistas. Talvez até a prestação da casa própria.
Quero a tranqüilidade de saber onde estarei semana, mês, ano que vem.
Quero esquema de check-up anual.
Quero programar um aniversário de 40 anos de união dos meus pais, que casaram na sugestiva data de 6.9.69.
Quero salário fixo, programação de férias, aposentadoria... Sou tão caótica com minhas contas quanto meu salário, que não passa um semestre estabilizado.
Quero agendar meus sábados de cerveja/caipirinha, nos botecos, com as amigas, uma musiquinha, encontrando quem chegar. Rituais precisam de periodicidade.
Quero o frio de volta. Se não vier, quero montar uma estrutura para suportar o verão, que me maltrata fisicamente.
Quero assistir meus programas regularmente, ler meus jornais em papel, trabalhar em um horário minimamente fixo.
Quero regras para poder ser livre porque ando refém da minha liberdade.

Texto feito em momento revoltoso, depois de descobrir que a UEL suspendeu as aulas até dia 31 de agosto por conta da gripe suína. Não é raiva da universidade nem dos porcos; é da suspensão que a medida causa na minha vida. Ou seja: não garanto nem uma mísera ideia interessante para os próximos posts.

terça-feira, 11 de agosto de 2009

Holístico

Às vezes, somos só cabeça. Pensamos e executamos na base da racionalidade e da necessidade. Não existimos; apenas passamos.
...
Às vezes, somos só coração. E aí a vida para, fica estagnada em apenas uma estação. A alegria e a tristeza se concentram no fluxo de uma só veia. Não existimos; rodopiamos.
...
Às vezes, somos só alma. Concentramos nossa vivência no desapego de todo e qualquer vínculo emocional ou material. Não existimos; levitamos.
...
Mas, às vezes, e só às vezes, somos tudo e queremos mais. Acordamos e dormimos intensamente, como se todos os deuses estivessem iluminando o caminho. Não existimos; vivemos.

segunda-feira, 10 de agosto de 2009

Pós-aula

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“Filmes deveriam ser um meio como qualquer outro,
talvez mais valioso que qualquer outro, de escrever história.”
Roberto Rossellini (*)
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Foi sábado a minha primeira aula para um curso de pós-graduação. A idéia de entrar em uma sala que pudesse ter sociólogos, historiadores, designers, jornalistas, letristas, advogados, publicitários e até dentistas me assustava. Pior: em uma área que não faz parte da minha formação acadêmica principal, muito menos da formação profissional. A área era Cinema e Documentário. E, se por acaso dirigi algum filme na minha vida, foi no chá-bar da Paola, e fui rapidamente e amplamente desclassificada como a amiga que fica com a câmera na mão. Duvidaram até do meu diploma de jornalista na época.

Mas, com o que estudei aqui e acolá, além da ajuda inquestionável do Fabrício, montei a aula. Dei o título “A representação da censura militar no cinema nacional”, o que facilitou metade do caminho. Era importante caminhar por onde eu conhecia. Ao longo das duas últimas semanas, fui editando, editando, mas foi na sexta-feira que bateu a preocupação. Respirei fundo, quase varei a noite revendo o roteiro da aula, lendo textos alternados, tentando achar uma frase que conseguisse abrir a aula (*), e, é claro, me irritando por não ter meus livros todos em Londrina.

Acordei tarde no sábado, subi para o Pátio São Miguel, tomei um expressão, depois mais um, li a Gazeta do Povo para respirar notícia, imprimi o material de aula, xeroquei um texto da BRAVO! na JK, e voltei para casa rever os pontos principais já bem acordada.

Havia marcado com o coordenador do curso uma conversa prévia parar 13h30. O medo de não achar o caminho para a faculdade me fez sair de casa exatamente 12h45. E não é que cheguei lá de primeira, feito uma londrinense cruzando o Igapó?

Pisei na faculdade e fui avistando os vários potes de álcool em gel. Um climão estranho, corredores vazios... O professor chegou e nos demos bem de cara. Sociólogo, gente boníssima – minha irmã bem havia me avisado. A turma era pequena mas bastante variada e, neste sábado de alerta da gripe suína, estava menor ainda. E não é que foi melhor? Pude interagir com cada um ali. O que senti de diferente é que, na pós, a maior parte das pessoas realmente está lá por opção – uma constatação que nunca tive quando aluna. E, cá entre nós, quando a gente faz alguma coisa porque quer, escolha mesmo, tudo fica melhor.

A sala era moderníssima, com carteiras adaptadas para lap-top e todas as mídias instaladas – eu usei lousa, como sempre. Abrimos a janela para ventilar porque o ar condicionado não é politicamente correto hoje em dia. Como o calor voltou também em Londrina, deixei a porta aberta. Não é que, antes do intervalo da tarde, algumas mulheres começaram a instalar mesas enfileiradas, com toalhas brancas e várias bebidas e quitutes diferenciados? Perguntei aos meus alunos (professor tem uma mania de usar o pronome possessivo...) e eles me confirmaram que o banquete era para nós.

Os dois períodos da aula fluíram bem, e passaram mais rapidamente do que eu imaginava. Finalizei quando já não tinha ninguém na faculdade, e a mesa ainda quase cheia continuava lá. Na saída, alguns alunos ainda beliscaram, eu dei um gole numa coca, e fomos. Achei conveniente falar para o porteiro ir lanchar. E, para dar uma pincelada de tristeza no meu quadro londrinese cheio de coisas boas, ele me contou: “Eles falaram que era para a gente guardar o que sobrasse na geladeira”. Falei, como quem não pode apitar nada, com uns gestos e palavras soltas, que era para ele desencanar e mandar ver.

Fica sempre a questão de como a aula foi recebida. Insegurança de professor e necessidade de aceitação, com certeza. Porque, se você tem uma turma, sente o retorno dos alunos ali, no dia-a-dia, convive tanto que vai balizando e banalizando a auto-crítica. Em um encontro efêmero como este, de apenas um módulo da minha primeira pós, só mesmo passando um formulário de satisfação com sugestões, críticas, pontos fortes, fracos, notas para cada quesito: enredo, alegoria, evolução, harmonia e mestre sala!

sábado, 8 de agosto de 2009

no Senado

Não dá para apagar os raios de ódio no olhar do Collor, nem a dissimulação da fala do Sarney (estes ex-presidentes...). Em uma semana tosca, de dar nojo mesmo, cinco minutinhos de música e de emoção na sexta-feira dos pais.

Só poderia ser ele. E com "a" música.
Tem como não gostar do cara?

http://www.youtube.com/watch?v=At-k9JDfOk8

quarta-feira, 5 de agosto de 2009

Ex-petacular


Relacionamentos que terminam sempre deixam um rastro que diz muito sobre as pessoas. Alguns, chegam ao final da história na hora certa. Outros, não. Trazem sentimentos de impotência, mágoa, vai-e-vem, frustrações variadas, ciúme e uma posse que gruda feito cola. Tem gente que lida mal; gente que lida muito bem... Uma grande amiga minha sempre é muito próxima dos ex-namorados, de dar inveja. Uma outra, que eu também amo, não quer nem saber: descarta os anteriores, risca da lista, passa um liquid paper e pronto.

Eu não concebo guardar ódio de uma relação duradoura, principalmente depois que ela acaba. É uma compreensão que vai além de mim: como pode passar um bom tempo com alguém e, depois, só guardar o pó do café? Será que nem um saborzinho ficou? Nem um tanto do cheirinho bom do que se bebeu junto?

Há poucas semanas, passei por uma situação interessantíssima. Meu ex-marido me pediu para assinar a venda de um apartamento que ele comprou quando estávamos juntos. Belê. Marcamos no cartório e passamos a tarde toda lá, em uma sala, ele com sua atual mulher, os compradores, vendedores, corretores, cartorários e eu. Incômodos à parte (até todo mundo entender que eu era a ex-esposa que só foi assinar, e que a mulher dela era a outra moça, e que eu não queria nenhuma parte da grana, um constrangimento só), fomos amplamente elogiados por sermos tão amigos.
Colocamos o papo em dia, rimos muito, lembramos das pessoas que tínhamos em comum, gente que casou, viajou, separou, teve filhos e até os tios que já se foram... Amplos e vários laços que sempre me uniram ao italiano de alma limpa, que eu conheci quando ainda não tinha nem carteira de motorista. Muito bom conversar com o Má.

O cara é um amor de pessoa (quem conhece, sabe), um homem de uma integridade inquestionável, carinhoso, que me respeitou até o último minuto. Largou tudo, e com muito orgulho, para acompanhar meu mestrado em Londres. Um anjo na minha vida e por quem sempre terei carinho e respeito. Foi meu primeiro amor.

Lamento muito por quem não pode ter este tipo de relacionamento, porque um ex sempre traz muito de nós mesmos, do nosso passado, de quem somos, das repetições e, principalmente, da memória de uma época. Eu tento, e bem consigo, ter um ótimo tete-a-tete com os que foram importantes na minha vida. Mas sei que a amizade com um ex é meio que assim: se um não quer, os dois brigam.

É a pessoa que te viu crescer, sair da casa dos pais, entrar na faculdade, arrumar um emprego, trocar de emprego, de cidade, cortar o cabelo, deixar tudo crescer, ficar doente, viajar, ganhar quilinhos, perder o juízo... Sua importância não pode ser mascarada por um ou outro fato isolado - principalmente se este fato for negativo. Porque, de boa, o corpo não comporta muito mágoa, não. E no curto e bom inglês, shit happens, em qualquer relacionamento, família, emprego, amizade, vizinhança... Imagina armazenar todas as raivinhas acumuladas na vida?

O ex é o espelho da memória.
É o livro com as notas de rodapé de uma época da sua vida.
É o passado ambulante, andante e falante.
É passado e é eterno porque é um pouco você.

segunda-feira, 3 de agosto de 2009

Gripadíssima


Eu sou aquela pessoa que absolutamente não fica gripada. Todos passam com vírus ao meu lado, e eu permaneço imune. Posso beijar, conviver, fazer tudo que as Secretarias de Saúde estão praticamente proibindo. Mesmo quando é com a Mileninha e com a Laila, minhas duas pequenas, que grudam no meu pescoço, eu no máximo dou uns espirrinhos. Aí, faço uma boa limonada, tomo a aspirina C e durmo. Se sentir que a garganta também está "pegando", faço a minha sopa antigripal (alho, cebola, cenoura ralada, tomate e macarrãozinho) e acordo nova.
Chego até a ser chata com meus amigos que espirram sempre e me preocupo com a reincidência e da fraqueza que abate os gripados. Fico dando minhas receitinhas como se elas fossem milagrosas para todos. Já li em vários lugares que os vegetarianos tem uma imunidade maior, já que não gastam muita energia na digestão da carne. Eu realmente acho que é verdade, porque já tem mais de dois anos que eu não caio de cama por este motivo.
Mesmo assim, a H1N1 está alterando minha vida. Primeiro foi a UEL, que, no final de junho, teve uma visitante “gripada” e suspendeu as aulas por dez dias. Volto eu para Bauru. Depois, retornei para terminar o semestre, tive duas semanas de férias e programei a volta para 3 de agosto, como todas as universidades brasileiras. No final da semana passada, um turbilhão de notícias e pronunciamentos que só a internet conseguiu acompanhar. Era uma faculdade atrás da outra anunciando o adiamento das aulas.
Em Londrina, mantivemos as reuniões. Fui e voltei para Bauru, claro, para recepcionar a Paola, voltando da Itália. Cheguei aqui e a pauta também é a gripe suína. Pior: Dani não pôde ir porque a sogra está com suspeita, e mandou a família toda ficar em casa. Todo mundo já conhece alguém que está ali, doente ou grupo de risco. Agora pouco, soube que também não irei para a facul hoje à noite, conforme previsto: a Unip também deixou para o dia 10.
Não pego gripe, mas me sinto bem gripada.