quarta-feira, 5 de agosto de 2009

Ex-petacular


Relacionamentos que terminam sempre deixam um rastro que diz muito sobre as pessoas. Alguns, chegam ao final da história na hora certa. Outros, não. Trazem sentimentos de impotência, mágoa, vai-e-vem, frustrações variadas, ciúme e uma posse que gruda feito cola. Tem gente que lida mal; gente que lida muito bem... Uma grande amiga minha sempre é muito próxima dos ex-namorados, de dar inveja. Uma outra, que eu também amo, não quer nem saber: descarta os anteriores, risca da lista, passa um liquid paper e pronto.

Eu não concebo guardar ódio de uma relação duradoura, principalmente depois que ela acaba. É uma compreensão que vai além de mim: como pode passar um bom tempo com alguém e, depois, só guardar o pó do café? Será que nem um saborzinho ficou? Nem um tanto do cheirinho bom do que se bebeu junto?

Há poucas semanas, passei por uma situação interessantíssima. Meu ex-marido me pediu para assinar a venda de um apartamento que ele comprou quando estávamos juntos. Belê. Marcamos no cartório e passamos a tarde toda lá, em uma sala, ele com sua atual mulher, os compradores, vendedores, corretores, cartorários e eu. Incômodos à parte (até todo mundo entender que eu era a ex-esposa que só foi assinar, e que a mulher dela era a outra moça, e que eu não queria nenhuma parte da grana, um constrangimento só), fomos amplamente elogiados por sermos tão amigos.
Colocamos o papo em dia, rimos muito, lembramos das pessoas que tínhamos em comum, gente que casou, viajou, separou, teve filhos e até os tios que já se foram... Amplos e vários laços que sempre me uniram ao italiano de alma limpa, que eu conheci quando ainda não tinha nem carteira de motorista. Muito bom conversar com o Má.

O cara é um amor de pessoa (quem conhece, sabe), um homem de uma integridade inquestionável, carinhoso, que me respeitou até o último minuto. Largou tudo, e com muito orgulho, para acompanhar meu mestrado em Londres. Um anjo na minha vida e por quem sempre terei carinho e respeito. Foi meu primeiro amor.

Lamento muito por quem não pode ter este tipo de relacionamento, porque um ex sempre traz muito de nós mesmos, do nosso passado, de quem somos, das repetições e, principalmente, da memória de uma época. Eu tento, e bem consigo, ter um ótimo tete-a-tete com os que foram importantes na minha vida. Mas sei que a amizade com um ex é meio que assim: se um não quer, os dois brigam.

É a pessoa que te viu crescer, sair da casa dos pais, entrar na faculdade, arrumar um emprego, trocar de emprego, de cidade, cortar o cabelo, deixar tudo crescer, ficar doente, viajar, ganhar quilinhos, perder o juízo... Sua importância não pode ser mascarada por um ou outro fato isolado - principalmente se este fato for negativo. Porque, de boa, o corpo não comporta muito mágoa, não. E no curto e bom inglês, shit happens, em qualquer relacionamento, família, emprego, amizade, vizinhança... Imagina armazenar todas as raivinhas acumuladas na vida?

O ex é o espelho da memória.
É o livro com as notas de rodapé de uma época da sua vida.
É o passado ambulante, andante e falante.
É passado e é eterno porque é um pouco você.

Um comentário:

Marcella Moreira disse...

Fantástico.
Quero aprender isto "O corpo não comporta muita mágoa".