segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Estranhamente feliz


A semana passada começou diferente. Na segunda-feira, ainda nem batia 7h no relógio e eu já estava na estrada, no caminho para Londrina. Vinha toda preparada: passei protetor solar número 50 até nas pálpebras, peguei a garrafinha de água tirada do freezer, dinheiro no bolso para pagar os 4 (QUATRO) novos pedágios que estão colocando no meu caminho, e a perspectiva de ir bem devagar para contornar o movimento de uma volta de feriado nas rodovias por onde passo.

O nublado quente de Bauru deu lugar a uma chuvinha gostosa que logo passou, e veio uma brisa deliciosa. Detalhe: passagem livre nos novos pedágios. Melhor: parecia domingo, quando a estrada tem poucos carros e caminhões. Teoricamente, era a volta de um feriado, mas, para mim, parecia ser o próprio – e ainda com um ventinho gelado. Foi ótimo, mas estranho.

Entrei no meu apartamento e senti uma coisa ruim. Entre tantas idas e voltas, sempre quando entro em Londrina e piso no meu cantinho daqui, fico tranqüila. E, dessa vez, senti uma tristeza... Um sentimento diferente que ainda não sei gramaticar.

Depois foi a cachorra, que definitivamente não está bem. Acho que é psicológico ou psicossomático, não sei, mas a bichinha está estranha. Fora os problemas físicos que ela vem tendo ultimamente, ela deu de se esconder embaixo da minha cama, fica andando inquieta pelo apartamento, os pelos estão caindo, brincadeiras ficaram estabanadas e está com um olhar inquieto que nem Freud justificaria.

Na UEL, um clima tenso de eleição do nosso departamento, fechamento de semestre, correção de Trabalhos de Conclusão de Curso e mais tantos detalhes que envolvem de uma forma meio injusta os recém-chegados como eu. Parece panela assoviando.

Outra coisa que pode explodir a qualquer momento é meu apartamento. Detectei um possível vazamento no banheiro, a persiana que pouco funciona, lâmpadas que queimam rapidamente, uma vizinha que adora me atormentar, um aparelho de DVD que eu não consigo ver funcionar e uns barulhos estranhos que mais parecem de fantasmas. Até Shú estranha e cheira as paredes insistentemente.

Acho que fiquei de mau humor com tudo isso. Alguns alunos, em reuniões de pauta, me fizeram gargalhar gostoso, mas meu semblante parece carregado, eu sei. E todos perguntam. O que aconteceu? O que você tem? Está tudo bem, Má?

Estou cansada, exausta, não tenho férias há cinco anos, saí de um pique e entrei no outro, ainda não estou bem acomodada em Londrina, tenho muito trabalho para ser finalizado até dia 23, estou dormindo pouco, uma dor de cabeça que gostou de mim, pendências emocionais para resolver, o desgaste da estrada...
São vários os motivos que podem nos puxar para baixo.

Mas eu tento, e tento, mostrar como estou bem. E estou, apesar do franzido registrado na testa.
É que algumas felicidades, mesmo tão felizes, vem revestidas de preocupação.

domingo, 22 de novembro de 2009

O forno e suas possibilidades

Coisinha fácil de fazer, e para quase toda hora. Pode acompanhar qualquer comida, virar um apetizer ou um antipasto para deixar curtir até o outro dia. Aliás, berinjela é que nem pizza: fica ótima no dia seguinte.
Dá para calcular uma para cada pessoa que for comer. Corte as berinjelas ao meio, verticalmente, e pique cada metade em pedaços do tamanho de um dado. Jogue em uma assadeira e misture bem com muito azeite e uns bons dentes de alho espremidos. Salpique sal e pimenta do reino, se gostar.
Leve ao forno, mexa umas três vezes com uma espátula, virando e deixando o aroma perfumar a cozinha. No começo, coloque o fogo alto, mas quando começar a assar, abaixe.
Para quem é mais light, depois de pronta, pode até escorrer em um papel. Para quem é exagerada feito eu, deixa arder, porque o azeite da berinjela vai combinar perfeitamente com um talharini, ou com um simples tomate cortado e queijo para comer com pão integral. Pode colocar de lado umas azeitonas, umas castanhas, acompanhadas de um bom Malbec argentino, e você tem uma refeição gastronomicamente praticamente completa. Talvez a abobrinha italiana, nesta mesma receita, também fique boa. Vou experimentar.

Os outros legumes também dão certo no forno, mas com outras artimanhas. Eu gosto de fazer batata, mandioca ou mandioquinha (que é chamada de mandioca-salsa no Paraná) embrulhadas no papel alumínio com um pedaço de manteiga. Dá para colocar em temperatura máxima e ir tomar banho tranquilamente. Quando ficam prontas, é só jogar sal e pimenta do reino, ou até arriscar um queijo - qualquer um.

Comida de forno é prática, saudável e não suja muito talher. É para se explorar.

20 de novembro

Data importante: aniversário da minha mãe. A escorpiana nasceu em 1934, com uma família já grande, na rua Cussy Júnior, perto da, agora vendida, sede central do BTC. Sob o som das rádios de Getúlio Vargas e às vésperas da segunda guerra mundial, Norma Neme veio para trazer alegria e desafiar diversas pedradas.
Sempre foi a palhaça dos irmãos, a confidente, a organizada e a baladeira também. Não perdia um baile e deixava os corações aos saltos com a elegância dela. Tinha 58 centímetros de cintura, imaginem só. Namorou um, dois, três, quatro pretendentes (todos, aliás, já morreram) até encontrar meu pai em 1967, e casar-se em 1969.
Foi quando a “nossa” pequena família começou. Na primeira gravidez, do menino que o marido tanto queria, ela sofreu, literalmente, um aborto espontâneo aos cinco meses. Meu irmão mais velho se chamaria Fernando, e tenho certeza que ele seria desses homens apaixonados pela mãe. Como todos que a conhecem.
Norma engravidou novamente. Veio a Mirelle, linda, forte, e trouxe a alegria para o casal. As fotos do meu pai e minha mãe com a pequena são de chorar, tamanha a alegria deles. E eles continuaram. Um ano depois, minha mãe estava de barriga de novo. Em junho de 1972, nasceu a Milena, um enigmático serzinho que abalou as estruturas.
O “pediatra” que “explicou” a síndrome de down para os meus pais – que não faziam nem idéia do que era – disse que a filha deles nunca andaria, nunca falaria e que dependeria deles para absolutamente tudo. Mesmo com pouca grana, tiveram a orientação de psicólogas desde o início, o que mudou a previsão apocalítica e ignorante do médico.
Em 1973, minha mãe engravidou novamente – mesmo tomando pílula. O médico dizia que ela não podia nem chegar perto da cueca do meu pai, de tão fértil. Mas a gravidez assustou. Norma já tinha 39 anos, e a família temia a possibilidade de nascer outra criança com limitações. Todos a aconselharam a tirar o bebê, mas o desejo de ter outra companhia para as duas meninas era mais forte. Corajosa, a minha mãe. E eu nasci, com 4,850kg.
Nossa infância foi difícil para minha mãe, que se equilibrava com a falta de dinheiro e as exigências de estimular a Milena. Nossa casa era um playground, cheio de brinquedos educativos para desenvolver a filha do meio. Aos três anos, ela começou a andar e logo foi soltando suas palavras cheias de vogal. Mérito da minha mãe.
As duas outras meninas também deram um bocado de trabalho. Mirelle teve várias pneumonias quando criança/adolescente, e eu era um moleque, sempre de braço quebrado ou arranhões das partidas de “queima” na rua.
Quando eu tinha uns 14 anos, Milena teve seratocone no olho direito. E este seria um dos maiores sofrimentos para minha mãe, que acompanhou os três transplantes de córnea e as internações infindáveis em Campinas que atravessaram alguns anos. Mesmo assim, a filha perdeu totalmente a visão de um olho. Uma revolta que permeou todos nós, e que regrediu a evolução comportamental da Milena em vários anos...
Tentamos, depois, internar a Mi em uma escola famosíssima em Betin, Minas. Preparamos todo o enxoval; achávamos que era o melhor para ela. Meus pais a levaram de Del-Rey, a deixaram na escola, foram para o hotel dormir e passaram a noite toda chorando. Os dois. No dia seguinte, bem cedo, voltaram para resgatar a filha e levá-la de volta para Bauru. É indescritível lembrar da emoção de ver o carro entrando na garagem, com a Mileninha no banco de trás.
Anos e anos mais tarde, com as filhas já adultas, minha mãe enfrentou seu maior medo. Teve o diagnóstico de câncer, a tão temida palavra. Cheguei de Londres, em 2001, e logo estava no hospital com ela, para a cirurgia que tentou tirar o máximo de nódulos do linfoma que a atordoava. Depois, começou a quimio, que puxou minha mãe para baixo. Ela não se conformava com o cabelo caindo, com a doença, com os exames que mostravam como ela estava fraca... Brigou com Deus, brigou com o mundo, e pouquíssimas coisas a faziam feliz, apesar da previsão de cura completa.
Nas vésperas da última sessão do tratamento, porém, uma médica descobriu um nódulo na mama direita. Exames depois, estava confirmado o tumor, que deveria ser retirado logo. A previsão de um famoso mastologista de Bauru era péssima: talvez, tiraria a mama toda. Eu o odeio até hoje. Levamos mamãe para São Paulo, onde achamos um médico muito gente boa que abriu o céu nublado. Tirou um quadrante, deixou o peito dela lindo, mas recomendou o tratamento nada agradável. Quimio, novamente, e radioterapia. Norma ficou pior ainda de humor, triste, reclusa, machucada e amargurada.
Ano passado, recebeu “alta” completa dos médicos. Está totalmente curada.
Em 2003, outras notícias mudaram a vida dela. Primeiro, eu e Mário nos separamos. E ela sofreu pacas. Minha mãe via o genro como um filho. Má era atencioso e amigo de Norma. Logo depois desta perda, veio o maior ganho, maior presente, maior benção: Mirelle engravidou, e minha mãe conheceu sua primeira e única neta.
Laila é a paixão da minha mãe, por quem ela faz quase tudo. Digo “quase” porque Norma é um ser que cuida de várias pessoas. Não deixa um parente, funcionário, vizinho, o marido, nem uma filha desatendida quando precisam. Talvez seja porque, a cada ano, ela adquire uma nova habilidade, novas modernidades. O aniversário de 75 anos, por exemplo, foi comemorado com o segundo furo para brinco em cada orelha que ela fez recentemente. Ficou um charme.
Apesar de ser muito amorosa, é uma escorpiana nata, que sabe se defender quando precisa... É passional como uma adolescente. É sorridente como uma criança. É amiga e mãe como poucas conseguem ser. É motivo de orgulho e de segurança para uma filha apaixonada.

Ps. Não dá para esquecer que a mesma data é aniversário do querido bar Armazen e do inesquecível lançamento do jornal BOM DIA.

terça-feira, 10 de novembro de 2009

Ménage à trois

Sexta-feira, 18h45, na bela rodoviária de Londrina, eu me vi absolutamente tomada pela emoção de receber meus amigos na minha nova cidade. Na noite anterior, não teve sono que me ganhasse. Uma ansiedade que eu não me aguentava, povoada de preparativos, comprinhas e possibilidades de passeios. De tão agitada, fui comprar um açúcar branco normal, para nosso café, e acabei comprando aquele especial, tipo confeiteiro.

Na rodo, corri atrás de todo e qualquer ônibus da Garcia. E são vários por minuto. Todos devem ter pensado que eu estava esperando um namorado apaixonante; os motoristas riam do meu ir e vir. Quando o carro que vinha de Bauru estacionou, dei um abraço triplo no Fabrício e na Paola lindíssimos. Eu já sou sortuda de tê-los, mas recebê-los foi ainda mais gratificante. Pazinha abraçada com seu travesseiro, ainda sonolenta, e Fá acordadíssimo admirando a arquitetura da rodoviária.

Paramos no Pátio São Miguel e a primeira revelação: Fabrício me mostrou a importância e singularidade dos ferros retorcidos que contornam aquela bela esquina. Na descida para minha casa, mostrei os bares, e os dois já se apaixonaram pelo querido vizinho tailandês, Varanda.

Descemos em casa para deixar as coisas, tomar um banho e brindar com o Santa Cristina que eu havia comprado. Santa Cristina é o vinho da Pá, o vinho do pai dela que aniversariava naquele dia 6, o vinho dos momentos especiais com a italiana... O brinde com o bom vinho mostrou o que seria o final de semana: saboroso, especial e bem encorpado.

Levantamos das cadeiras e fomos para o Varanda a pé. Lotado. Gustavo, que nos atendeu, previu umas cinco pessoas na nossa frente. Deixamos o nome na lista, mas descemos para pegar o carro e tentar o Bar das Meninas. Não demorou muito para Londrina querer “se mostrar” para meus amigos bauruenses. Caiu aquele toró com o qual os paranaenses são acostumados.

Ficamos esperando parar um pouco a chuva para descer. Não parava. Íamos voltar para o Varanda quando vi o Tomate Seco com um lugar para estacionar na frente. Propus, eles toparam e descemos. Eu não conhecia o lugar, mas adorei de cara. É o que o Fabrício falou: jantar uma bela massa ouvindo uma banda de rock ótima foi perfeito para inaugurar a primeira noite em Londrina.

Sábado, fui levá-los para passear e comprar vinhos. O spot principal foi o Mercadão Shangrilá, lugar que eu admiro cada dia mais. Semanalmente eu passo por lá, mas no sábado, e com meus dois amigos, o lugar ganhou outros tons e cheiros. De lá, passamos no Mercado Guanabara, mas a chuva não deixaria o DJ tocar. Nem pensamos duas vezes: fomos para minha casa deixar o carro e subir a meia quadra que me separa do Varanda.

Que lugar, que tarde, que cardápio, que atendimento, que gente bonita, quanta simpatia, que som bom, que Bohemia Oaken perfeita, que comida... Os dois se apaixonaram de cara e já decretaram: o nosso sábado seria ali mesmo.
Fabrício não acreditou que poderíamos fumar na mesa. Paola ficou embebecida com tanto homem bonito e variado. E eu não acreditava que o belo bar/restaurante, que visitei – com sucesso - umas duas vezes, poderia ficar ainda melhor. Chegamos no começo da tarde, pegamos a melhor mesa de todas, em vários sentidos, e não largamos dela até a noite. Conversamos sobre tudo, rimos muito e fortalecemos ainda mais a amizade e a certeza de que eles voltarão a me visitar.

Mas a italiana não aguentou tanta emoção e sono. Foi dormir em casa. Fá e eu ainda ficamos lá, conversando, conhecendo gente e descobrindo mais coisas boas sobre a querida-por-todos-Londrina. Fechamos a conta felizes e satisfeitos com a cidade. A balada já havia sido feita.

Chegamos e ainda batemos papo até outras horas. Pá acordou, dormiu, acordou... A chuva veio geladinha, e continuou até de manhã, quando fomos tomar café na Pandor que, estranhamente, estava fechada. Levei-os ao Pátio, que ainda tinha alguns remanescentes da festa à fantasia Metamorfose. Tomei um dos melhores cappuccinos da minha vida, que leva o nome da loja de conveniência que nunca fecha. Todos saímos satisfeitos direto para a estrada. Nem a chuva nem o apartamento apertado estragaram o final de semana.

Na nossa “mistura a três”, só faltou mesmo a Laura. Pá veio meio dormindo meio acordada. Fá e eu tagarelamos o tempo todo no caminho entre as duas cidades. Quando avistei Piratininga, diminuí a velocidade. Não queria chegar porque não queria que acabasse.
Mas não acaba.