segunda-feira, 31 de agosto de 2009

Meu eterno sofá


Trouxe para Londrina a minha bicama. Deve ter perto de uns 30 anos. Foi comprada pela minha mãe, mas eu não lembro onde ela ficava na casa antiga dos Neme-Buzalaf. Na residência atual, para onde nos mudamos quando eu tinha uns 11, 12 anos, serviu de sofá enquanto os almofadados da alvenaria não ficavam prontos. Só que a bicama era mais larga do que o gesso, e fazia com que as três filhotas ficassem com as perninhas abanando no ar enquanto assistiam tevê sem controle remoto. E dá-lhe jó-quem-pô para decidir quem ia mudar o canal.

Assim que as almofadas modernas chegaram, a bicama com estampa de floresta tropical ficou armazenada no quartinho de despejos da casa. Muitos anos e emoções depois, fui morar sozinha, e minha mãe me deu a bicama que, com uma manta, virou sofá. Puxa vida, foi meu primeiro sofá, o lugar onde recebia as pessoas, onde descansava depois das longas jornadas no Jornal da Cidade, meu cantinho para ler os prospectus do mestrado que queria fazer, preparar a papelada toda... Lá, ficou vivo até eu ir para Londres. Foi quando os dois colchões voltaram juntos para o quarto de despejos da família. Encostados, sem uso, mas sempre limpos pela Vicentina.

Voltei de Londres, fui morar com o Má em um belo apê, mas que não tinha espaço para o quase-sofá de cores gritantes. Continuou na casa dos meus pais. Sempre o olhava saudosa quando ia buscar um azeite, ou um refri na dispensa da Norma. Poucos anos depois, me separei e levei apenas o que já era meu: a geladeira, o fogão, a velha estante de livros e a mesa do computador (continuo com os mesmos). Aluguei o pequeno apartamento perto do shopping e peguei de volta a bicama, que foi um belo sofá no meu primeiro ano e meio de separada. Lá, eu me preparei para o doutorado, recebi amigos, conheci gente e montei muita aula para a Unesp e USC.

Quando mudei para o predinho, onde ainda moro em Bauru, levei a bicama mas logo comprei um sofá branco, que combinou com todo o resto. Ela voltou a ficar sem uso, armazenada no salão de festas do prédio, que funciona de depósito para nós, moradores. Nunca achei que deveria doá-la, já que seus dois colchões são firmes e fortes como nenhuma novinha seria. Roberto sempre me mantinha informada: “Coloquei sua bicama para tomar sol hoje”.

Eis que fui percebendo que estava faltando um sofá aqui em Londrina. Levar o meu branco, com três assentões, impossível. Comprar, também, não seria o caso – não foi por isso que aluguei um apertamento(sic) mobiliado? Lembrei da bicama, mas antevi problemas. Primeiro: não achei que ela dobraria a ponto de caber no meu carro (que tem a bunda encolhida). Mas coube certinho no banco de trás. Segundo: vim pensando que a dita poderia tumultuar ainda uma sala tão micro. Pelo contrário.

Eu tenho, agora, um sofá na minha sala que, incrivelmente, parece maior. Sentada perto do chão, a tarde está mais fresca, a Shú mais perto e tranquila, os livros aqui do lado e a caneca e o cinzeiro também. Fiquei melhor confortada aqui com minha bicama-amiga, e até mais feliz por dar vida a ela de novo.
Parece que esses dois colchões vão me acompanhar até, no mínimo, a aposentadoria.

Nenhum comentário: