domingo, 29 de março de 2009

Pensamento

"Pensamento vem de fora
E pensa que vem de dentro
Pensamento que expectora
O que no meu peito penso

Pensamento a mil por hora
Tormento a todo momento
Por que que eu penso agora
Sem o meu consentimento?

Se tudo o que comemora
Tem o seu impedimento
Se tudo aquilo que chora
Cresce com o seu fermento

Pensamento dê o fora
Saia do meu pensamento
Pensamento vá embora
Desapareça no vento

Não jogarei sementes
Em cima do seu cimento"

Arnaldo Antunes e ponto final.

terça-feira, 24 de março de 2009

Eu, meio veggie, meio Saramago

Ontem, saí da faculdade com tanta fome que cheguei em casa, logo comecei a cozinhar e, na minha obsessão por abobrinha, decidi fazê-la na frigideira porque queria algo mais rápido, mas, ao vira-la, toquei fortemente meu dedo no azeite quente, de forma a praticamente fritá-lo, e senti uma dor absurda que só foi sanada com um copo de água com gelo, onde deixei meu dedo imerso e praticamente congelado por um tempo, até que, ao tirá-los por alguns segundos, e eles começarem a descongelar, voltava a dor insuportável da queimadura, e eu não pude deixar de pensar em como alguns bichos vivos sofrem sofrimento similar simplesmente para chegarem aos pratos ricos que exigem a dor intensa, o sangramento angustiante dos porcos, o engordar dos gansos e dos bezerros, o mergulho na água quente das lagostas, a vida maltratada de algumas “produções” em nome de um prazer tão efêmero quanto substituível, já que carrega uma carga de sofrimento inquestionável, desnecessária e cruel, e é justamente por isso que eu prefiro as abobrinhas que, no máximo, podem nos levar ao dedo queimado e mostrar que a carne é, sim, viva.

sábado, 21 de março de 2009

WELL...

Passei por todo esse processo de concurso esta semana, prestando o teste seletivo da Estadual de Londrina para professor de jornalismo. Minha irmã sorteou o tema que eu mais queria para a minha aula para professores: “Pauta – formatos e conteúdo”. Pirei. Entrei de cabeça na minha estante e nos meus arquivos. Levei um jornal da China que eu tenho, um Clarín, a edição do Che Guevara da revista Realidade de agosto de 1968, a Caros Amigos sobre o filho do FHC com a jornalista da Globo, uma TPM que tem um post-it na capa...

Cheguei, montei o arsenal, dei a aula olhando nos olhos deles (como faço com meus alunos), usando a lousa, mostrando os jornais, e cumpri o plano da aula finalizando em tempo.
Depois, sentei para responder as perguntas, que foram 15% sobre a aula em si, 25% sobre minha visão sobre a universidade e o curso de jornalismo, e 60% sobre mim! Questionavam porque eu ficaria em um contrato de 2 anos (prorrogável por mais 2) se eu poderia tentar uma universidade federal, perguntaram se eu moraria em Londrina, como me vejo daqui 5 anos, o que penso da UEL...

(Acho até que estou me acostumando a passar por bancas, a ser questionada, a ver o que acatar, o que questionar, o que não aceitar e o que completar.)

Fiquei chocada com o campus de lá. Coisa linda. Absurdamente bem cuidado, com todos os cursos de graduação possíveis. O curso de jornalismo é um capítulo à parte, com 20 alunos por turma e uma galera cheia de vida. Os professores da banca também gostei – nos demos bem de cara. Não parecem estrelas cadentes e me trataram com respeito e proximidade.
Mesmo eu não tendo sonhado com esta faculdade, gostei.

No final da tarde do outro dia, veio a notícia.
Passei em primeiro lugar. E ainda com uma média altíssima para concurso: 9,5.
Fiquei várias horas sem conseguir pensar nisso, com a cabeça flutuando, brigando comigo mesma. Plano A, plano B, planadora... Acabei de defender o doutorado, mal descansei, planejava as federais que são mais efetivas e com o processo de contratação mais lento.

Well...
A vida tem caminhos que a gente nem imagina mesmo...

Não vou fugir por teimosia do que eu havia imaginado. Mudar a rota pode levar a caminhos bem melhores. Ou ao mesmo caminho, mas por outras paisagens.

Vou, mas vou planando...

24 HORAS

O sistema de concursos no Brasil pode ter sido inspirado na ficção norte-americana. Você faz todo o arsenal (única palavra que eu encontro para descrever o sistema de inscrição, com tudo carimbado, documentado, rotulado...) e manda. Ok, sua inscrição deu certo - avisa a central.
Mas, para prestar a prova, para passar pela banca, você precisa sortear um ponto, de dez temas oferecidos no edital, para montar uma aula exatamente 24 horas depois. Se presta concurso longe, como é o caso da maioria, fica impossível levar a biblioteca até a cidade do concurso. Também não dá para preparar todos os possíveis assuntos.
Geralmente, você consegue alguém para fazer o sorteio para você. Mas nada é tão fácil no país da burocracia. Precisa, sim, fazer a procuração, mandar para a pessoa, que sorteia o tema e logo te avisa. Começa, então, the final countdown.
Você tem um dia completo para elaborar o plano de aula, o que vai usar, o que vai mostra, o que vai botar na lousa, como vai começar, como vai finalizar, que bibliografia usou, imprimir tudo.... A aula é sempre para professores qualificados, mas você precisa agir como se fossem alunos.
No final, o candidato Jack Bauer só pode ter dois caminhos: conseguir chegar lá primeiro que o concorrente; ou ter de buscar um asilo acadêmico em outro país.

sexta-feira, 13 de março de 2009

Fast!


Preciso sanar minha necessidade de escrever com carinho cada item deste blog e entender que, agora, minha vida está fragmentada. Fast, very fast.
Então, vamos lá:


1. Qual o sentido, depois da defesa, de ser doutora? – pergunta de um amigo da minha irmã que eu mal conheço, por email, que me fez ficar em silêncio absoluto por um tempo.
Faz todo sentido. Aliás, parece que, só agora, tudo faz sentido. Até hoje, minha vida havia sido uma sucessão de acontecimentos e decisões, tomadas com muito pouca racionalidade, devo dizer. Por que só agora absolutamente tudo faz sentido?

2. Atenção à propaganda da pomada Nebacetin, que nem é nova. Vários “tipos” de família aparecem no comercial, sempre com a setinha indicando o “pai” e a “mãe” da história. De repente, aparece uma moça correndo com as amigas e, nela, uma plaquinha de “mãe e pai”. Depois, dois moços caminhando de mão dadas, sendo um deles carregando um filho naquela “mochila” de bebê. A identificação dos dois é “pai” e “pai”. Está no Youtube, é claro.

3. Incrível a irmandade da qual as mulheres compartilham. Sentimentos pela outra e com a outra. O pensamento é recorrente na minha cabeça – certamente porque tenho grandes amigas - mas foi esta semana, depois de assistir a vídeos dos gêmeos da Vanessa, que eu pude sentir o som, a dinâmica, o espaço e o cheiro de abóbora da casa que minha amada amiga, e sua grande família, moram. Vi, nos meninos, um pouco da Van, do Cassinho, irmão dela, do Fernando; vi também mais do que um pai: um grande companheiro. Chorei de emoção. Somos amigas desde os nossos 14 aninhos.

4. O meu arsenal para os concursos está praticamente pronto. O currículo ficou legal, em uma bela pasta, com minha história “torta”. Tenho certificados que nem imaginava; e procuro outros que eu nem guardei! Vocês sabiam que tem universidade federal que pede, além do currículo e suas munições todas, e do memorial descritivo, um projeto de pesquisa para a disciplina? Acho bacana. Outra coisa legal: uma faculdade privada, a PUC de Campinas, também adotou o sistema para contratar professores.

5. Um amigo brilhantemente me disse, dia desses, que a crise chegou as relacionamentos. Sim: escassez, inflação, temor geral, ações em baixa, relações de consumo... Olha a situação em que me encontrei neste final de semana. Fui ao Armazen com meu querido Fabrício – e, há muuito tempo não saímos juntos (e foi ele, Fá, quem me tirou de casa depois da minha separação). Um moço bem interessante chegou perto, teve uma boa abordagem e, quando eu perguntei o nome dele, não consegui entender o que ele falava. Som muito alto. Aí, ele me disse: Meu nome é Cristian, do Cristian e Ralf!
Percebem a crise?
Que bom que, raramente, coloco minhas ações “no mercado”...

6. Sobre o pós-tese: jantar no Templo com minha mãe, Paola, Fabrício, Laura, Dani Guedes, Beto e a Clarinha. Foi delicioso. Uma alegria que foi condizente com o trio de jazz que lá tocava, e a orgia alimentar daquele restaurante. Vinho e caipirinhas de kiwi na mesa. Tudo divino. E os presentes não poderiam ser melhores; por isso, a imagem deles neste texto.
O vinho, Dolcetta D´Alba, é um prazer raro mesmo. Só o Fabrício mesmo... Nunca havia tomado nenhum italiano assim. Guardei a garrafa e a rolha, é claro, para marcar este momento. Um vinho que merece seu brasão.
O outro é de uma originalidade absurda. Descoberto pela Dani, e apoiado pelas meninas, ganhei um John Lennon que fala. Uma achava que era uma estátua; outra, disse que era um tipo de um “falcon”! Ele é lindo, com uma imagem em NY e, ao ser acionado, solta sua voz original, dizendo: “All I´m saying is give peace a chance”. Ganhei um boneco de doutorado! Detalhe: minha cachorra tem medo absurdo do Beatle falante.

quinta-feira, 5 de março de 2009

Viva!

Ao escrever este verbo, a gente já pensa em um texto sobre motivação na vida, sobre a felicidade de cada dia...

Não deixa de ser este o caso, mas, em inglês, a palavra é pronunciada “vaiva”, já que o “i” tem sol de “ai”, e tem outro significado: o de “uma banca de defesa pública”, geralmente usado para a defesa do doutorado.

A minha “viva” foi ontem.
Um dia inesquecível.

Manhã de sol em Assis. Mas, quando acordei, ainda estava bem escuro. Minha mãe dormia no mesmo quarto que eu, no refrigerado hotel Plaza. Fui ao banheiro, voltei para a cama e, com a iluminação pequena, tentei rever os itens básicos da tese: Sumário, Introdução e Considerações Finais. Nossa; fiquei cheia de questões.

Fui conectar a internet, com esperança da Zélia me dizer que a banca havia sido cancelada. O sentimento era de não querer ser julgada por aqueles professores; já chega conviver com as minhas próprias cobranças! Quando minha mãe acordou, eu perguntei para ela: “Mãe, eu posso não ir?”. Ela morreu de rir, e nem me respondeu, o que me deu total noção de que a fuga seria non-sense.
Quando fui ver o celular, mensagens de carinho total das irmãs mais lindas: Dani e Cris (para mim, a Kéka) Guedes. Conectei a internet, e dois emails saltavam os olhos: do Ali, de Londres, lembrando do dia e não me desejando sorte porque disse que eu não precisaria; e do Heverton, meu aluno querido, perguntando se ainda dava tempo de me desejar boa sorte... Peguei uma foto do Flávio e coloquei no bolso da calça.

Energias incríveis que, de repente, explodiram com o telefone do Fabrício dizendo que ele, Paola e Laura já estavam em Assis. Pasmém: na padaria onde tantas vezes tomei café, a Super Mini Pão Quente! A Lu, minha companheira das idas à Fema (faculdade onde dei aula) vai lembrar: sempre ficamos intrigadas com o nome da padoca.
Os três saíram de Bauru às 5h da madrugada para assistir uma banca de quase cinco horas no meio do sertão fronteiriço de SP-PR. Detalhe: os três estavam lindos, felizes, sorrindo, com uma força que me recarregou. Pensei: já valeu a pena! Percebi que era, também, um momento de emoção – um sentimento, inclusive, que eu estava tentando reprimir para lidar com a carga de questionamentos que a banca sempre traz. Cada um com sua pesquisa, com sua interpretação, com seu histórico, com seu repertório...
Chegamos à faculdade pouco antes das 8h. Fabrício desceu do carro carregando sua bolsa com o equipamento Pentax suuuuuper “pro”. Paola também já começou a registrar. Dois amigos fotográficos: eu só poderia ser jornalista mesmo.
Nenhum professor havia chegado, mas dúzias de jovens se amontoavam na porta da Sala da Congregação, onde as banca são realizadas. Fomos percebendo que era o pessoal do primeiro ano da faculdade, que acabou de entrar no vestibular. E eu ali, saindo da condição de aluna.

Logo apareceu um funcionário da UNESP para abrir a porta da sala, e uma senhora que trouxe o café, as xícaras, as garrafas e copos d´água para os membros da banca, e para mim, que fiquei em uma mesa reservada, também conhecida como o “banco dos réus” para os doutorandos. No mestrado, o aluno ainda tem mais o que pesquisar; no doutorado, não tem mais desculpas.
Minha torcida entrou na sala e se acomodou. Fá e eu fomos fumar um cigarro quando um dos professores da banca chegou. O anarquista, que foi uma ótima banca na minha qualificação, trazia uma imagem de São Jorge na camiseta, justamente porque ele seria meu guerreiro maior. Mas eu ainda não sabia. Sorte que eu também usava meu anel com o mesmo santo, o protetor dos arianos.
Logo depois, chegou o segundo membro da banca. Li a tese deste ex-aluno do doutorado lá em Assis há uns dois anos, e ela continuou comigo esse tempo todo. Foi orientando da Zélia também, e trabalha com jornalismo e história. Um professor surpreendentemente bonito.
O terceiro a chegar foi o meu querido, muito querido, que me conhece da UNESP daqui, uma pessoa incrível que extrapola o meio acadêmico. Max me trouxe uma força; me lembrou do meu caminho.
Por último, Zélia e sua convidada da UFF, a melhor faculdade de história, chegaram. A carioca era suplemente da professora da PUC-SP, que ficou doente, e fez várias baldeações de avião e ônibus para chegar até o nosso sertão. Além disso, minha tese foi extraviada pelos Correios, e ela demorou a receber. Era a análise que eu mais temia, por ser do Rio (casa do Pasquim), por ser da tal federal...
Dei aqueeeele abraço na minha orientadora, que já foi ajeitando tudo para poder começar. Acho que sou old-fashion mesmo: fiquei feito besta em pé ao lado da minha cadeira, e só sentei depois de um professor me autorizar.

Zélia abriu a banca e começou pela convidada. Pronto: estava frita! Mas a professora de nome bonito e sotaque gostoso me surpreendeu e trouxe as reflexões que ela teve a partir da minha tese. Ultrapassou seus 30 minutos, deixou algumas questões interessantes e eu, que estava absurdamente e surpreendentemente concentrada, respondi todas. Com muita calma, também extrapolei meu tempo. No meio da minha resposta, a Mirelle linda chegou de Londrina para me ver. Mais um apoio.
Partimos para o outro convidado, o ex-orientando da Zélia, agora professor da UEL. Ele tentou trazer discussões jornalísticas, já que é da área e trabalha com ilustração. Eu também fui longe nas respostas, sem nem perceber que o tempo passava para os outros. Eu estava adorando tudo aquilo.
Fizemos um intervalo de 10 minutos.
Zélia, com sua maneira direta, veio correndo me avisar: fale um pouco mais alto e vamos abreviando as respostas. Quando vi no relógio, era 11h15 e ainda tínhamos mais duas arguições. Pior: ficaríamos sem almoço em Assis!
Fiquei ouvindo a visão dos meus amigos que, pela primeira vez, assistiam a uma banca de doutorado.
Um cigarro e um café depois, voltamos para a sala.

Foi a vez do Unespiano de Bauru, que situou minha pesquisa no campo de imprensa alternativa e da historiografia, discutindo os limites da pesquisa acadêmica. Com seu sotaque da Espanha, fez elogios ao meu texto, o que me deu vontade de levantar e dar um beijo na testa dele! Sua arguição foi rápida, com poucas perguntas, mas ele falou tudo olho no olho. Ele só pensou em mim; não nos seus colegas.
Mas, quando chegou a vez do São Jorge anarquista, a batalha realmente começou. Tinha mantido na minha cabeça que aquele era apenas um protocolo, uma das etapas dos meus quatro anos de doutorado. E que, lá, as defesas costumam ser duras. Das três que eu assisti recentemente, em dois casos, membros da banca perguntaram qual era a tese daquela pesquisa! Já ouvi uma professora falar que um dos capítulos de uma tese deveria ser, na verdade, apenas um artigo. E por aí vai...

Mas, at the end of the day, ninguém ali poderia questionar o fato de eu realmente ter uma tese. Não havia como duvidar do que minha pesquisa tentou materializar: o Pasquim conseguiu, sim, ser um jornal duradouro, questionador da moral vigente, durante todo o período de censura, mas só o fez porque era humorístico e teve um grupo de intelectuais e artistas que o constituíram. E é isso que se deve fazer: construir uma tese e, a partir dela, mostrar suas relações com os elementos que permeiam o tema.
Mas, com exceção da certeza de ter uma tese fundamentada, e o apoio da minha orientadora extremamente competente e respeitada, todas as minhas outras escolhas poderiam ser questionadas. E foi o último professor que fez esse papel.

Alguns questionamentos: Por que colocar tanta ênfase na capa? O conceito de geração pode ser usado como fonte e objeto da historiografia, como eu fiz? Os artigos sobre o Pasquim no New York Times e o ratinho Sig não mereciam mais espaço na pesquisa?
É aquela coisa: se você fala em exílio, eles vão mostrar que muitos artistas se auto-exilaram, como o Chico; se fala de um auto-exílio compulsório de Caetano e Gil, ao retratar a pressão dos militares, vão questionar por que você não abordou os exilados, revolucionários e violentados.

Sim.
Sim.
Não.
Talvez...
Mas...
De outro lado...
Será que...?

O guerreiro começou a questionar alguns termos, indo em algumas páginas pontualmente, deixando todos ali angustiados. Mal consegui anotar tudo que ele falou. O Fá, que fazia a “ata” da minha defesa, escrevendo tudo foi falado, também se perdeu na fala do arguidor mais contundente.

Respirei.
Mentalizei uma luz amarela me iluminando.

Quando ele parou, ficou aquele silêncio fúnebre e a espera de como eu iria me portar. Cumpri o protocolo de agradecimento das considerações, e afirmei que não saberia se conseguiria abordar todas as questões levantadas. Respondi algumas questões, questionei outras visões, expliquei alguns pontos, esclareci algumas escolhas, e ele ainda fez algumas réplicas – foi o único.

A questão dele era: será que alguém pensaria que a ditadura não foi tão violenta ao ler minha tese?
A resposta só veio depois de algumas horas.

Não.
Primeiro porque meu recorte historiográfico era outro. Era o Pasquim, e, ali, ninguém sofreu violência física.
Segundo porque não estava estudando a ditadura, mas, sim, a censura. E em um só jornal. Mais recortes.
E, terceiro, pelo próprio fato de pesquisar as formas com que o semanário conseguiu ser publicado sob a censura militar – sendo o único alternativo a sobreviver por mais de seis anos com essa pressão – já mostra que a dita-dura não foi uma dita-branda.

Mas eu estava mentalmente exausta. Geralmente, o primeiro professor a falar já traz os problemas mais sérios de uma tese. Não achei que ali, nos 20 minutos do segundo tempo, depois de três análises, alguém fosse criticar uma nota de rodapé que fala da influência da Geração Beat (que é da década de 50) na Geração de 60.

Nossa.
Foi difícil.

Quando veio Zélia, e sua consideração sobre a banca, meu trabalho e eu. Ela deixou de lado aquele ar sisudo, apesar de estar aparentemente esgotada pela maratona de bancas e pelo adiantado da hora, e valorizou meu trabalho, relevando meus problemas durante o percurso do doutorado, e o fato de eu ser jornalista, não historiadora. Elogiou meu esforço, minha evolução, e pediu para todos saírmos da sala, para eles deliberarem.

O ar estava rarefeito.
Senti um peso nas costas, uma sede, uma vontade de voltar e começar tudo de novo.

Minha mãe queria entender o que eles iam fazer lá com as portas fechadas. Fabrício respondeu: “Um suruba, Dona Norma”, e todos rimos compulsivamente. Meus queridos queriam matar o São Jorge...

Minha cabeça estava zonza, com tantos pensamentos que parecia que eu não conseguia pensar nada direito.
Mas minha orientadora logo abriu a porta.
Voltamos e, todos em pé, ouvimos minha orientadora me conferir, em nome de toda a banca, o título de Doutora em História pela UNESP.

Naquele momento, tudo fez sentido. Chegar até ali, enfrentar cinco professores, conseguir responder aos principais questionamentos, é o que te constrói. É mais o aprender a pesquisar do que a pesquisa em si. É o caminho, mais do que a chegada. É mais o começo do que o final.

Todos bateram palmas para mim.
E meus olhos ficaram cheios de água.

“Viva”! Muito “viva”!

ps. O texto sobre o pós-defesa será postado em breve!